“Não sou a favor, mas respeito” não é respeitar, é LGBTfobia

Existe um problema enorme quando a pessoa não quer ser preconceituosa, mas, ao invés de mudar o pensamento, muda apenas a forma como coloca a intolerância pra fora

Quantas pessoas declaradamente LGBTfóbicas você conhece? Pense um pouco. Agora, reflita sobre quantas pessoas você conhece que dizem não ser LGBTfóbicas, mas poderiam falar, ou já falaram, coisas como "não sou a favor, mas respeito"? Essa frase, que esteve em destaque nas redes por ter sido compartilhada por Rafa Kalimann e Caio Castro, é mais comum do que deveria - vamos, então, conversar um pouco sobre essas pessoas. O que exatamente significa “não ser a favor”? O que exatamente significa discordar que um cidadão desenvolva laços afetivos e sexuais com quem ele bem entender?

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É um exercício curioso tentar entender o que se passa na cabeça de alguém que diz esse tipo de frase. O que ela acha que vai acontecer com a não-aceitação dela sobre questões identitárias de terceiros? Pessoas LGBTQIA+ vão desaparecer em um estalo porque um indivíduo cis-hétero aleatório não aceita elas? Pessoas LGBTQIA+ vão acordar no dia seguinte dentro de corpos cis-hétero? Pessoas LGBTQIA+ vão abrir mão de se apaixonar, beijar, transar com outras pessoas LGBTQIA+ por conta da não-aceitação alheia?

Sinto muito informar, mas nada disso vai acontecer. Pessoas LGBTQIA+ não vão desaparecer num passe de mágica. Pessoas LGBTQIA+ não vão parar de nascer. Sim, isso é importante: existem pessoas LGBTQIA+ desde sempre e quando as que aqui estão se forem, novas ocuparão seus lugares. Pessoas LGBTQIA+ não vão ter uma vida relegada às quatro paredes, ao sigilo, ao armário. Foi assim antes, não será mais. A esse processo damos o nome de progresso - regredir, jamais.

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"Não ser a favor, mas respeitar" é, em outras palavras, anunciar publicamente que você é preconceituoso, mas não vai manifestar seu preconceito de formas que considera extremas. O que exatamente essas pessoas acham que significa respeitar? Não quebrar uma lâmpada na cara de alguém? Não humilhar publicamente, não agredir fisicamente, não assassinar LGBTs? Pois aqui vai uma novidade interessante para você: sua intolerância disfarçada de respeito mata. E digo mais: ela é parte essencial de uma cadeia complexa de perpetuação da LGBTfobia.

Quando você reforça, em alto e bom som, sem sequer se envergonhar disso, que não é a favor da existência de um tipo específico de pessoa, essa mensagem circula pelas suas bolhas de convívio e impacta outras pessoas. Se você é um influenciador com 20 milhões de seguidores então, nem se fala - mas a real é que isso vale pra todo mundo. Uma mensagem de ódio a LGBTs disfarçada de tolerância como essa pode ser a fagulha para encher o balde de ódio de outra pessoa que também “não é a favor”, mas tem outra concepção sobre a parte do “respeito”.

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Se não ficou claro, o ódio opera em modelo de escalada. Ninguém “desrespeita” pessoas LGBTQIA+ se não sentir que existe uma base de apoio para isso. E essa base de apoio não é composta só por pessoas que entendem respeito da mesma forma. Você só se sente confortável para falar publicamente que não aceita LGBTs porque escuta coisas semelhantes no seu grupo de amigos, nos stories do seu influencer preferido, na sua igreja. O sujeito que sai de casa para matar travestis pensaria duas vezes antes de colocar o pé pra fora da porta se ele achasse que não tem ninguém alinhado com o ódio dele. Mas tem: você. 

É ingenuidade ou leviandade achar que nossos posicionamentos não impactam outras pessoas: todo mundo que "respeita, mas não aceita" tem um pouco de sangue nas mãos, quer queira, quer não. Opinião inofensiva é gostar de menos sal da comida, gostar mais de verde do que de azul, gostar de funk e de MPB. Advogar contra um determinado grupo de pessoas alimenta uma cadeia de ódio que mata pessoas que tem mãe, pai, filhos, amigos, amores. 

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Entenda: você não aceitar não muda o fato de que essas pessoas vão continuar existindo. Não aceitar alguém por ser quem ela é ou por quem ela ama diz mais sobre você, inclusive, do que sobre ela. O preconceito só encontra espaço para crescer onde não há reflexão crítica, já que é fruto de desinformação e medo. Reflita sobre a origem desse incômodo, de onde ele vem, porque ele existe, que diferença faz na sua vida. E pense bem: se alguém supostamente te respeitasse, mas não te aceitasse sendo como você é, isso seria suficiente para você? 

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