Derrubando mitos sobre ocupações urbanas: Vila Nova Palestina
Nós visitamos a ocupação no extremo sul em São Paulo para conversar com quem mora lá.
Esse post é o primeiro de uma série do BuzzFeed em ocupações urbanas de São Paulo.
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
Nós vamos mostrar como vivem e qual é a luta das pessoas que habitam esses espaços em 2020.
Essa reportagem tem uma versão em vídeo que você pode ver no Instagram do Buzzfeed Brasil – segue a gente por lá para acompanhar as próximas!
Nossa primeira visita foi na Ocupação Nova Palestina, em começo de novembro.
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
A ocupação Vila Nova Palestina foi fundada em 29/11/2013, e é uma das maiores ocupações urbanas da América Latina. Fica na estrada M'Boi Mirim, extremo sul da cidade de São Paulo, já perto do município de Itapecerica da Serra.
"Esse era um terreno ocioso que virou pasto ao longo dos anos. As poucas árvores que tem aqui foram todas preservadas por nós. Nós ocupamos para destinar para moradia popular. Nós estamos em região de manancial, porém dentro da lei de mananciais do estado de São Paulo existe um coeficiente de aproveitamento de uma contraparte produtiva de uma casa para cada 250 metros. Essa é uma área de um milhão de metros quadrados e significa que aqui poderiam ser construídas até quatro mil unidades habitacionais. Depois da mudança do Plano Diretor de São Paulo, em 2014, ele se transformou em Zona Especial de Interesse Social. Isso depois de uma luta de sete dias acampados na frente da câmara de vereadores." - Jussara Basso, coordenadora estadual da MTST e candidata à vereadora em São Paulo.
A Jussara também tocou em um dos ponto mais mencionados por quem não conhece a luta por moradia: ocupação não é invasão.
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
"Ocupar você ocupa aquilo que não tem serventia e não está sendo utilizado pra nada. É nesse sentido que uma ocupação ocupa um espaço ocioso e faz uma denúncia que aquela área poderia ser destinada a moradia popular, inclusive a forma que essas ocupações se consolidam é justamente para indicar qual é o déficit habitacional do território e mostrar que aquelas famílias poderiam estar morando numa área que no momento não está destinada a nada. A invasão tem um outro sentido porque é ocupar, favelizar e construir moradias irregulares."
O "barracão" é o coração da Nova Palestina, um espaço de convivência onde acontecem assembleias e eventos culturais – interrompidos agora durante a pandemia. Todas as questões essenciais da vida na ocupação são decididas de forma coletiva.
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
Mais de 75% das pessoas que vivem na Nova Palestina são mulheres.
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
Como Joelma:
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
"Venho nas reuniões e participo de todos os acontecimentos. A ocupação é um lugar que eu gosto, onde eu aprendo muito, que nos ensina a ter voz. Aqui aprendi a ser solidária com o próximo.Lá fora acham que somos massa de manobra, mas nós somos verdadeiras conhecedoras dos nossos direitos. Aqui nós sabemos que não podemos ser escravas de homem algum. Aprendemos que temos que ser respeitadas. Depois que esse governo que tá aí, que deu o golpe de estado no nosso país, tudo ficou diferente. A política é a arte de fazer o bem, de cuidar do outro, e não é isso que acontece no país hoje. Nessa hora o que dá mais força pra gente lutar." - Joelma Costa Dias
, que está com a ocupação desde 2013.
A ação coletiva na ocupação é responsável pela disponibilidade de água tratada em caixas-d'água coletivas e pelo tratamento correto de lixo. Além disso, os próprios moradores e moradoras realizam rondas de segurança para evitar entrada de estranhos.
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
"É muito gratificante estar aqui e fazer parte do movimento, porque ele abre muitas portas através de cursos e de ensino para as pessoas que não têm escolaridade. Eu agradeço muito de coração por fazer parte dessa família e se Deus quiser a minha moradia vai sair aqui na Nova Palestina." - Jane Santos, está com a ocupação desde 2013.
Segundo Jussara, "250 famílias moram na ocupação na forma que é possível, já que a gente ainda não tem a regularização da terra, moram em barracões iguais a esse de madeira, com telhas e piso."
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
"Não é possível ainda edificar, isso iria caracterizar loteamento irregular e significaria o fim da nossa luta de sete anos. Com o fim do programa Minha Casa Minha Vida a gente teve que mudar o formato do nosso projeto, agora a gente reivindica que o município de São Paulo faça a compra da área e a destine para moradias populares, com mutirões de construções de casas", conta, explicando porque não existem ainda casas levantadas.
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil
"A coisa que eu mais gosto aqui é que eu tô em paz. Aqui não tem porta de bar, bebedeira. Eu me sinto segura morando na ocupação. Sinto que estou numa comunidade. A gente faz comida, ajuda no barracão, limpa, ajuda a cuidar. É isso que eu gosto." - Maria de Lourdes Francisca dos Santos, a Dona Cigana, mora na ocupação desde 2013 e tem esse apelido por causa do cabelão preto e por gostar de usar saias longas.
Queremos lembrar que a moradia é um direito garantido pelo artigo 6º da Constituição da República Federativa do Brasil, que diz que "São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição."
Luisa Oguime/BuzzFeed Brasil