O que realmente levou ao fim daquele estudo de anticoncepcional masculino

Não, pessoal. Ele não foi cancelado porque os caras estavam sendo covardes.

Um novo estudo descobriu que injeções hormonais em homens poderiam ser altamente eficazes para evitar a gravidez.

O objetivo da pesquisa era descobrir se injeções de testosterona e progesterona suprimiriam a contagem de espermatozoides o suficiente para evitar a gravidez — e foi o que aconteceu!

A partir de 2008, pesquisadores então recrutaram homens em 10 locais diferentes, por todo o mundo, para testar a segurança e a eficácia de uma injeção anticoncepcional masculina. Em geral, a taxa de falha foi de apenas 7,5%.

Essa é uma notícia incrível. No entanto, a pesquisa terminou em 2011, depois que foram relatados efeitos colaterais significativos.

A história que correu na internet foi a de que os homens foram covardes e não conseguiram lidar com os efeitos colaterais do medicamento. Outra versão dizia que os pesquisadores estavam loucos para interromper um estudo devido aos mesmos efeitos adversos que as mulheres sofrem com o anticoncepcional hormonal. Resumindo, razões na linha: "Os homens não prestam! A ciência não presta!".

Mas nada disso é verdade.

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Aqui está por que o estudo foi interrompido:

Vadimguzhva / Getty Images

O BuzzFeed Health conversou com um dos coautores da pesquisa, Doug Colvard, que é PhD e vice-diretor de programas da Conrad (que copatrocinou o estudo).

No início do experimento, um Comitê de Segurança e Monitoramento de Dados (CSMD) independente foi criado pelos patrocinadores. Um CSMD é comum na maioria dos estudos clínicos para garantir uma avaliação de segurança independente. Este comitê recebia dados ao longo da pesquisa para assegurar que tudo estava correndo bem. Além disso, os pesquisadores também respondiam anualmente a um outro júri de avaliação dentro da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Durante uma dessas avaliações regulares, o júri observou que certos efeitos colaterais, especialmente os relacionados a alterações de humor e ao aumento da libido, eram mais comuns do que o esperado. Então, eles decidiram que o risco dos homens continuarem no experimento era maior do que os benefícios de continuá-lo até o fim para obter dados mais completos de eficácia e segurança das injeções. Eles recomendaram que não deveria haver recrutamento de novos participantes e que as injeções deveriam parar, com todos os homens sendo transferidos para uma fase de recuperação.

Os efeitos colaterais relatados com mais frequência incluíam acne, aumento da libido, dor no local da injeção, dor muscular e transtornos de humor.

Hey Paul Studios / Creative Commons / Via Flickr: hey__paul

Dos cerca de 1.500 eventos adversos relatados, determinou-se que cerca de 39% não estavam relacionados com a medicação.

Isso significa que a maioria dos efeitos colaterais possivelmente, provavelmente, ou certamente estavam relacionados à medicação, incluindo um caso de depressão, um caso de overdose intencional e um caso de arritmia cardíaca após a interrupção das injeções.

Algumas limitações que é preciso citar: os homens não foram questionados especificamente sobre depressão, ansiedade ou alterações de humor antes do início do experimento. E, por razões éticas óbvias, não houve grupo placebo neste estudo. Curiosamente, a maioria dos eventos adversos foram relatados em um local de estudo na Indonésia, embora os autores da pesquisa não especulem a razão disso.

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Claro, alguns homens abandonaram o estudo devido aos efeitos colaterais. Mas isso é normal em qualquer estudo.

FOX

Vinte homens abandonaram o estudo devido aos efeitos colaterais relacionados à medicação, o que não é incomum em estudos clínicos.

"Os participantes podiam abandonar o experimento se não achassem os efeitos colaterais aceitáveis", disse Colvard. "Mas, de longe, a grande maioria continuou, mesmo que estivessem sofrendo efeitos adversos leves ou moderados."

Na verdade, mais de 75% dos participantes relataram estar satisfeitos com o método e dispostos a usá-lo se ele estivesse disponível no mercado.

Então, dizer que este estudo foi cancelado porque os homens não conseguiram lidar com os mesmos efeitos colaterais que as mulheres sofrem com anticoncepcionais hormonais não está correto.

Monik Markus / Creative Commons / Via Flickr: 42954113@N00

Para começar, você não pode comparar a experiência pessoal com um medicamento com um estudo de fase II de uma droga que ainda não está no mercado.

"Este é um estudo inicial de uma droga nova, e há tantas coisas que não sabemos sobre ela", disse Jennifer Gunter, ginecologista e obstetra, ao BuzzFeed Health. "Você precisa compará-lo com um estudo equivalente de anticoncepcionais para ser justo. Eu não acredito que exista algum tipo de conspiração médica para proteger os homens dos efeitos colaterais dos anticoncepcionais."

Sem mencionar que, na verdade, os anticoncepcionais são conhecido por tratar a acne nas mulheres, não causá-la, disse Gunter. A dor muscular e a dor no local da injeção também não são efeitos colaterais comuns. Além disso, os pesquisadores observaram que alguns participantes demoraram para recuperar sua fertilidade, após interromperem as injeções. Oito participantes levaram mais de um ano para retornar à plena fertilidade. Esses efeitos colaterais não acontecem na maioria dos métodos anticoncepcionais femininos.

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Sobre as alterações de humor... é verdade que muitas mulheres passam por isso quando usam um anticoncepcional hormonal, e você deve conversar com seu médico, se esse for o caso.

Filadendron / Getty Images

Já houve uma série de pesquisas sobre a relação entre anticoncepcionais hormonais e a depressão, com resultados muito diferentes. O BuzzFeed Health falou com a epidemiologista Chelsea Polis para obter mais informações.

Em um estudo recente com mais de 1 milhão de mulheres entre 15 e 34 anos, o uso de contraceptivos orais combinados foi associado com um risco 10% maior de depressão e um risco 20% maior de usar antidepressivos. Esse risco foi maior para outras opções hormonais, e variou dependendo do método. Dito isso, apenas 2% das mulheres no estudo tinham sido diagnosticadas recentemente com depressão, e apenas 13% começaram a usar antidepressivos durante o estudo, então o risco real de ambos ainda era bastante baixo. E, ainda assim, isso não demonstra a causa, já que vários outros fatores podem estar em jogo.

Ainda assim, se você estiver sofrendo efeitos colaterais significativos com seu método anticoncepcional, fale com seu médico sobre outras opções.

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Claro, é uma merda que não estejamos mais próximos de ter uma opção anticoncepcional masculina, mas culpar os homens e os pesquisadores envolvidos nesses estudos provavelmente não vai ajudar.

"Se você quiser que mais homens se inscrevam nesses estudos, chamar de covardes os que relatam efeitos colaterais não é o caminho a seguir", disse Gunter. "Esse não é o jeito de promover a contracepção masculina."

Sempre haverá riscos associados a qualquer forma de medicação, e os anticoncepcionais não são exceção. Mas também temos décadas de pesquisas avaliando a segurança e a eficácia dos contraceptivos hormonais para as mulheres. Esperamos que, algum dia, também possamos dizer o mesmo dos anticoncepcionais masculinos.

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