Morte de bebê gera debate em torno do movimento "parto livre"

O "parto livre", também conhecido como parto sem assistência ou "free birth", ocorre quando uma pessoa dá à luz propositalmente sem qualquer assistência médica ou intervenções. Vale ressaltar que o "parto livre" não é o mesmo que os chamados "partos naturais", que geralmente envolvem uma profissional capacitada caso uma intervenção médica se faça necessária.

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Uma comunidade on-line de pessoas adeptas do "free birth" [parto livre] foi fechada nos EUA após a morte de um bebê no mês passado.

A mãe da criança fazia parte do grupo no Facebook e compartilhou suas experiências ali durante o parto.

O "parto livre", também conhecido como parto sem assistência, ocorre quando uma pessoa dá à luz propositalmente sem qualquer assistência médica ou intervenções – ou seja, sem ultrassons, medicamentos, monitoramento ou profissionais capacitados.

Em alguns casos, inclusive, as mulheres vão para lugares remotos exclusivamente para a criança nascer. Diferentemente dos partos sem assistência que ocorrem durante uma emergência (no carro a caminho do hospital, por exemplo) ou pela falta de acesso ao sistema de saúde, os "partos livres" são uma escolha consciente.

Vale ressaltar que o "parto livre" não é o mesmo que os partos naturais em casa, que geralmente envolvem uma profissional capacitada, seja uma parteira ou doula, que é capaz de ajudar caso uma intervenção médica se faça necessária, explicou Yvonne Butler Tobah, obstetra e ginecologista em Rochester, Minnesota (EUA), para o BuzzFeed News.

"O free birth é uma comunidade de mulheres que deseja a 'experiência mais natural possível', sem intervenção médica", diz. Isso quer dizer que a gestante dá à luz em casa ou até mesmo em algum lugar remoto, muitas vezes completamente sozinha. Trata-se de uma pequena vertente. Cerca de 1% dos nascimentos nos Estados Unidos, o que corresponde a aproximadamente 35 mil, ocorrem em casa. Aproximadamente um em cada quatro desses partos são feitos sem assistência, de acordo com o American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG).

Apesar disso, o movimento do "parto livre" vem se tornando cada vez mais popular nos EUA, principalmente porque a internet e as redes sociais fizeram com que esse pequeno nicho se tornasse uma grande comunidade online.

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Mulheres que estão optando pelo "parto livre" pela primeira vez e mães mais experientes conversam por meio de fóruns de mensagens, do Instagram e do Facebook. Inclusive, algumas compartilham vídeos e fotos dos seus partos. Um grupo privado do Facebook, chamado de Free Birth Society ("Sociedade do Parto Livre") tinha mais de 6 mil membros e foi permanentemente fechado no mês passado.

Porém, a Free Birth Society não está limitada somente ao Facebook — trata-se de uma empresa fundada por Emilee Saldaya, ex-doula de Los Angeles, EUA. A sociedade é descrita como um movimento de mulheres que desejam recuperar a sua autonomia durante a gravidez e o nascimento. Além de um site, podcast, dois blogs e um perfil no Instagram com mais de 22 mil seguidores, a Free Birth Society oferece consultas virtuais e pacotes de treinamento que variam de 98 a 899 dólares.

A empresa também vende um curso online intitulado "O Guia Completo Para o Parto em Casa" por 600 dólares. De acordo com o site, o curso prepara as mulheres para partos inesperados em casa e fornece uma "compreensão ampla e profunda de como é o parto normal na questão fisiológica e o preparo para que ele aconteça da melhor maneira possível".

Desde o dia 1 de novembro, a empresa permite que as mulheres se inscrevam para participar de uma rede exclusiva e paga, descrita como um ambiente mais seguro e privado, para substituir o grupo da Free Birth Society no Facebook. Saldaya fechou o grupo na rede social após viralizar o relato de uma mulher que contava a morte de seu bebê no parto.

A Free Birth Society não respondeu imediatamente à solicitação do BuzzFeed News para comentários.

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A mulher em luto pela morte do filho conversou com o Daily Beast sob o pseudônimo "Lisa". Ela disse que ficou em trabalho de parto por seis dias em uma parte remota do deserto da Califórnia antes que os médicos retirassem seu bebê natimorto, cujo nome era Journey Moon. Durante o período, ela publicou atualizações no grupo do Facebook e recebeu mensagens de encorajamento — até que procurou ajuda médica após sua bolsa ter estourado e ela passar a sentir muita dor por não conseguir urinar.

“[Journey Moon] faleceu devido à uma grave infecção do trato urinário que eu desenvolvi. Estou na cama do hospital enquanto escrevo essas linhas", postou Lisa no grupo, de acordo com o Daily Beast.

Embora muitas das mulheres do grupo tenham demonstrado apoio, outras criticaram a mãe por não ter procurado ajuda médica antes — incluindo trolls que haviam se juntado secretamente à Free Birth Society — o que fez com que a postagem fosse compartilhada fora do grupo. Algumas pessoas culparam a mãe pela morte da criança, chamando-a de "assassina de bebês", de acordo com o Daily Beast.

Em 22 de outubro, Saldaya publicou um comunicado, na página pública da Free Birth Society, dizendo que fecharia permanentemente todos os quatro grupos privados na rede social. Ela disse que vinha sofrendo "um assédio sem fim" e recebido ameaças de morte.

No mesmo comunicado, Saldaya negou qualquer envolvimento com o nascimento de Journey Moon, alegando que não aceitou nenhum pagamento da mãe, não ofereceu quaisquer aconselhamentos médicos ou disse que ela não deveria ir ao hospital. Saldaya declarou, no entanto, que conversou com a mulher em mensagens privadas no Facebook para oferecer palavras de apoio tanto antes quanto depois do nascimento.

"A dolorosa realidade é que bebês podem morrer durante o nascimento em qualquer ambiente, incluindo no hospital. Todas as mulheres devem estar cientes da possibilidade de falecimento que existe para todas nós", escreveu Saldaya.

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O parto sem assistência não é ilegal nos EUA e as mulheres têm o direito de decidir por conta própria o que vão fazer em relação ao trabalho de parto e o nascimento. Elas também têm o direito de recusar cuidados médicos a qualquer momento. O consentimento informado é exigido dos pacientes antes que os profissionais possam realizar qualquer intervenção ou cirurgia (com algumas exceções, claro, em casos de emergência).

Além disso, não é possível forçar alguém a ter seu parto no hospital, de acordo com Butler Tobah. No entanto, há vezes em que os ginecologistas-obstetras não recomendam partos em casa, mesmo com um profissional qualificado presente — por exemplo, em casos de mães hipertensas ou quando o bebê está na posição errada. Nesses casos, é mais seguro dar à luz em um hospital ou maternidade, que são lugares equipados para lidar com partos de alto risco, explicou Butler Tobah.

Gestantes devem sempre conversar com seus médicos para entender os riscos e decidir qual é a melhor opção para elas e seus bebês.

A maioria das mulheres que não têm uma gravidez de alto risco pode ter um parto vaginal, de acordo com Butler Tobah, mas é difícil prever o surgimento de complicações. As coisas podem mudar repentinamente e, caso a situação se torne emergencial, é preciso tomar decisões rápidas para tentar salvar a vida da mãe e do bebê.

"Na obstetrícia, temos dois pacientes, a mãe e um bebê ainda não nascido", diz. Muitas intervenções que se fazem necessárias para que o bebê nasça com segurança, como uma cesárea de emergência ou o uso de fórceps e outros equipamentos, também podem afetar a mãe — em muitos casos, de maneira negativa.

Quando a realidade do parto é diferente das expectativas da mãe, pode haver um conflito, levando a sentimentos de insatisfação ou falta de confiança. O movimento do "parto livre", de acordo com o site, se baseia na ideia de que há muito mais em relação ao parto do que é oferecido pelos obstetras tradicionais e parteiras. Em alguns casos, as mulheres sentem que o modelo médico deixa muito a desejar.

É importante comunicar-se adequadamente com os profissionais sobre os objetivos, riscos e possíveis resultados antes do parto. "Há momentos em que a comunidade médica como um todo, especialmente obstetras e parteiras, pode fazer um trabalho melhor ao educar pacientes sobre o que esperar e como as coisas podem mudar", diz Butler Tobah.

A médica também ressalta que atacar as mulheres que optaram pelo "parto livre" não ajuda em nada para uma comunicação saudável. "Em vez de ofender as gestantes, é importante se envolver com elas por meio de uma educação útil que pode tanto trazer o empoderamento que elas desejam, quanto suprir as expectativas na hora do parto", diz. Por exemplo, uma mulher pode querer um parto em casa sem intervenções médicas, mas com medidas protetivas e uma estratégia caso algo dê errado.

"Há muitas coisas que podem ser feitas para melhorar a experiência das mulheres enquanto garantimos uma experiência de nascimento segura", diz Butler Tobah.

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A tradução deste post (original em inglês) foi editada por Luísa Pessoa.

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