'Artista precisa ter compromisso com a democracia', diz Manno Góes

Músico falou com a gente sobre a decisão de proibir Netinho da Bahia de cantar "Milla" em atos antidemocráticos

Se você viveu os anos 90, certamente sabe cantar "Milla" de cabo a rabo.

Ao contrário do que muita gente pensa, a canção não foi criada por Netinho da Bahia.

A composição é de Manno Góes e Tuca Fernandes. Ela foi originalmente lançada em 1994 pela banda Jeremias Não Bate Corner, da qual os dois faziam parte.

Em 1996, foi regravada por Netinho e estourou nas paradas de sucesso.

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Acontece que, neste final de semana, em plena pandemia, Netinho da Bahia resolveu cantar "Milla" em cima de um trio elétrico, para uma multidão, durante um ato pró-Bolsonaro.

Entre outras pretensões, a manifestação pedia o fechamento do Superior Tribunal Federal e usava o slogan "Eu autorizo". A gente tem até medo de pensar para que seria essa autorização.

Além disso, faltando vacina e com 400 mil mortes por causa do coronavírus, Netinho e alguns políticos acharam razoável estimular a aglomeração - que a gente não vai mostrar aqui para te poupar do desgosto.

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A gente decidiu conversar com o músico para entender melhor.

Você pode proibir Netinho de cantar "Milla"?

"Milla" é uma composição minha, feita em 1994, com Tuca Fernandes. O autor tem o direito de permitir ou não que se grave a música. Todo mundo pode cantar livremente, agora, monetizar, usar em rede social, só pode com autorização do autor.

Vi "Milla" sendo usada em um ato antidemocrático, em uma postagem feita dentro dessa perspectiva, apoiando um governo que prejudica o Brasil durante uma pandemia. Isso tudo é muito desagradável. Meu viés político é oposto.

E você vai conseguir impedir que ela volte a ser cantada em manifestações como estas?

Meu advogado já notificou as partes (o cantor Netinho; a deputada Carla Zambelli, que publicou o vídeo; e as plataformas) para que retirassem as postagens das redes. E, caso eles se recusem, nós entraremos na Justiça baseados na lei do direito autoral.

A música pode não ser autorizada nessas circunstâncias. Se fosse outro artista, em outra circunstância, não me importaria. Tenho como autor o direito de retirar. Isso ter ocorrido faz também com que outros autores tenham consciência disso. Se alguém posta uma música de maneira que você não concorde, você pode solicitar que a música saia do ar na plataforma em que foi postada. 

Netinho não poderá mais cantar "Milla" em nenhuma circunstância?

Tenho total respeito pelos posicionamentos de todas as pessoas. A música é universal. Mas o uso dela em uma situação escancaradamente antidemocrática, pedindo o fechamento do STF me levou a pedir que isso não ocorra mais, nesse tipo de ambiente. Acho uma estupidez política. Não quero minha música participando de um ato pernicioso. Em outras circunstâncias, não. Não me importo se quem canta "Milla" é de esquerda ou de direita. Uma música é só uma música.

Chegou a falar com Netinho?

Não há diálogo pessoal entre Netinho e eu há algum tempo. Não é a primeira vez que há uma ruptura. Manifestei minha insatisfação publicamente.

Não deve ser legal ver a própria canção associada a atos como esse.

Quero desassociar a música dessa história. "Milla" é amor. Compus para uma paixão adolescente. Não tem essa associação com o ódio. Ela foi feita para celebrar a alegria e o amor. O artista tem que ter compromisso com a democracia e a responsabilidade social.


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Sorte a nossa! E a gente agora vai atrás da Daniela para mais detalhes da nova "Milla" ;)

Enquanto isso, dá para acompanhar o novo trabalho de Manno Góes.

Mais um de seus hits, "Praieiro" ganhou nova versão, agora eletrônica. O remix conta com os vocais de Rafa Barreto, a nova voz da banda Jammil e Uma Noites, e tem a participação dos Filhos de Sá, grupo formado e dirigido pela diva Sandra de Sá. Mandou bem!

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