Como a Marvel Studios transformou o Thor em gente como a gente

De Deus do Trovão a um herói DE VERDADE: gente como a gente.

A história do Thor no Universo Cinematográfico Marvel começou no já longínquo ano de 2010, quando um ARTEFATO foi encontrado no deserto do Novo México. Um artefato que ninguém, absolutamente ninguém -- nem mesmo Stan Lee -- conseguia tirar do lugar.

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Essa foi a cena pós-créditos de "Homem de Ferro 2". O Agente Coulson chega no lugar onde o Mjölnir caiu. Ele foi arremessado na Terra junto com o Thor, que CAUSOU lá em Jotunheim e foi banido, sem seus poderes, pelo papai Odin.

Em "Thor", filme de 2011, ficamos sabendo que Odin colocou um feitiço no martelo para que só pessoas DIGNAS consigam levantá-lo e ter os poderes do deus nórdico -- o que só acontece quando o próprio Thor oferece a própria vida pra salvar a dos amiguinhos, conseguindo assim derrotar o vilão Destruidor e Loki, seu irmão, que queria acabar com Asgard, assumir o trono e essa treta toda.

"Dignidade" é uma palavra que a gente precisa ter em mente daqui pra frente (pelo menos o significado, caso você já tenha perdido a sua).

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O mais engraçado é que, mesmo depois de recuperar o martelo, seus poderes e o OUTFIT, você olha pra essa barba e sobrancelha pintadas do Chris Hemsworth e se pergunta o que é dignidade, afinal, né? Mas divago. ;D

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Aí teve aquele dia em que o Capitão América conseguiu mover, ainda que bem pouquinho, o Mjölnir.

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Logo no começo de "Vingadores: Era de Ultron", num GET TOGETHER dentro da Torre Stark, os Vingadores estão curtindo um momento de paz no universo brincando de tentar levantar o Mjolnir. Eles duvidam de todo o lance da dignidade e acham que é só uma questão de força ou alguma coisa do tipo "leitor de impressões digitais".

Todo mundo, com exceção da Viúva Negra ("essa é uma pergunta que eu não quero respondida"), tenta. Tony Stark usa um pedaço da armadura, Rhodey outra, o Bruce Banner acha que se gritar adianta... Até que chega a vez de Steve Rogers, o Capitão América. E o martelo se mexe. Só um pouquinho.

Na cena (e nos cinemas) todos dão gostosas risadas, kkkk-que-engraçado-cê-viu-menina-ele-quase-levantou-hahaha. Mas o que ninguém havia percebido naquele momento e que talvez até agora não tenham se ligado é que estava ali o início de um processo que transformaria Thor – um deus, cujo primeiro filme foi dirigido por um especialista em SHAKESPEARE – no cara mais humano de todos aqueles Maiores Heróis da Terra.

Um deus... com problemas de saúde mental.

Um banho nas "Águas da Visão".

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Ainda em "Vingadores: Era de Ultron", a Feiticeira Escarlate (que ainda era uma vilã) colocou todos os Vingadores pra dormir, com sonhos que poderiam fazê-los perderem seus rumos completamente.

O que o Thor viu o deixou bastante incomodado -- o suficiente pra fazê-lo deixar os Vingadores e ir atrás de respostas na tais "Águas da Visão", versão cinematográfica do Poço de Wyrd, dos quadrinhos e mitologia nórdica.

Quem nunca precisou de um tempo pra procurar respostas pras dúvidas sobre a sua vida, sua existência? Poxa vida, o ato de procurar um psiquiatra, um terapeuta, chamar um amigo no zap, é um ato de busca de respostas. É um ato de se entender, pra poder se curar e, enfim, ser alguém autossuficiente. Um ser completo.

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"Thor: Ragnarok", trouxe o personagem de volta aos filmes, depois de um tempo buscando as tais respostas.

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Com a morte do papai Odin, sua irmã mais velha Hela conseguiu sair da prisão em que estava e resolveu continuar seus planos de expansão Asgardiana há tempos cancelados. A primeira coisa que ela faz? Destrói o Mjölnir, como se não fosse o MARTELO DE THOR COM FEITIÇOS QUE O PROTEGE e não sei o quê. A segunda? Joga seus dois irmãos mais novos pro LIMBO do Universo.

Sem seu martelo e perdido no universo, Thor começa um caminho de AUTOCONHECIMENTO que nem ele sabe que tá percorrendo.

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Taika Waititi, o diretor de "Thor: Ragnarok", tem um estilo bastante PECULIAR de direção. E ele conseguiu, através de um tipo de humor cotidiano, que todo mundo uma vez ou outra já viveu e vive, mostrar ao mesmo tempo toda a vulnerabilidade e o poder do Deus do Trovão.

É em "Ragnarok" que Thor percebe que não precisa do seu martelo pra ser um herói, apesar de tudo o que ele havia aprendido até então. É nesse filme, também, que ele percebe que não adianta nada tentar resolver os problemas antes de eles acontecerem e acaba permitindo a realização do Ragnarok, o apocalipse nórdico, quando se liga que essa é a única forma de derrotar sua irmã.

Deixa de ser sobre o que ele pensa que deveria acontecer, passa a ser sobre o que de fato acontece. Deixa de ser sobre ele evitar o Ragnarok, passa a ser sobre ele salvar os Asgardianos.

As cenas são das mais bonitas dos filmes da Marvel. E são elas, e esse filme, que fazem com que o Universo da Marvel tenha um SUPER-HERÓI que é super e herói ao mesmo tempo. Visualmente falando, inclusive!

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E então chegamos aos eventos de "Vingadores: Guerra Infinita".

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Já diria o seu Madruga: "a vingança nunca é plena, mata a alma e a envenena".

Depois de ser torturado, ver seu irmão ser assassinado sem que pudesse fazer qualquer coisa e absorver a energia de uma estrela, Thor resolveu mirar o Rompe-Tormentas -- a arma que substituiu o Mjölnir -- no PEITO de Thanos. Só que, como o próprio vilão diz: ele devia ter acertado a cabeça.

Essa vontade de vingança dele, esse rancor, essa raiva que Thor sente, o fez querer olhar nos olhos do vilão enquanto ele morria, lembrar ao Titã Louco por que aquilo estava acontecendo. Só que, como acontece em diversos outros momentos nesse filme, isso foi um desvio no seu objetivo que ele não deveria ter feito.

Thor acabou cometendo um erro que o atormentaria pelos próximos cinco anos. Thor, por motivos egoístas, permitiu que o Thanos estalasse os dedos e eliminasse 50% das criaturas vivas do UNIVERSO.

Um deus depressivo e ansioso.

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Se "Thor: Ragnarok" deu todo um novo propósito e tom ao personagem, em "Vingadores: Ultimato" temos o fechamento do arco. Thor se tornou um cara carismático, complexo, cheio de camadas e, bem... falhas.

No começo do filme, Thor fala pouco. Tá quieto. Um olhar perdido. O que ele fez (ou deixou de fazer) o traumatizou profundamente -- a ponto de não aguentar muita conversa e arrancar a cabeça do vilão assim que tem a oportunidade, LEMBRANDO o que o Titã Louco disse sobre "mirar na cabeça".

Aliás, Thanos conseguiu acertar em cheio a cabeça do Deus do Trovão com suas palavras e por lá ficou. Thor se tornou uma espécie de MENDIGO DOS MARES, alcoólatra e jogador de videogame dos mais tóxicos, completamente desleixado e descuidado com ele mesmo. É, na verdade, como se ele não existisse mais pra ele mesmo, uma das sensações mais doloridas que alguém pode ter (de verdade).

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Isso acabou tomando uma proporção talvez um pouco maior do que deveria, criando uma polêmica que talvez não precisaria ter surgido, mas que ao mesmo tempo rendeu uma discussão bastante interessante.

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Em um determinado momento de "Vingadores: Ultimato", o Thor aparece portando aquilo que muitos chamariam de "barriga de cerveja", e outros tantos de "gordofobia". Ok, é uma merda o lance de enchimento, etc, e tudo o que o Chris Hemsworth disse sobre as próteses que usou não ajudou muito. Isso é inegável.

Mas, PRA MIM, o que acontece em "Vingadores: Ultimato" é a ideia de mostrar o quão desleixado o Thor se tornou. Estar fora de ~forma não é ofensivo. Ser gordo não é ofensa, sabe?

Não vou entrar aqui na conversa de que ser gordo é diferente de ser saudável porque isso não deveria sequer ser discutido. Mas é aquela coisa: o "ideal", como todos aprendemos desde sempre, não é um corpo normal. Pior ainda: é como se ninguém pudesse ser bom sendo gordo.

Gordo sou eu, bicho. O Chris Hemsworth está com um corpo NORMALÍSSIMO. Pode ser um choque em relação ao que ele era antes, mas...

Mas até isso o Thor supera. E supera com aquela tal da dignidade que eu falei lá em cima.

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Assisti ao filme duas vezes e, sim, há uma piada sobre ele estar parecendo um "sorvete derretido" e outras duas sobre ele ter "salgadinho no sangue" e "restos de comida na barba".

Podemos aqui questionar se o lance do sorvete é ou não uma tentativa de ofensa pela aparência física do cara, mas ele só comer salgadinhos e ter resto de comida na barba é sinal do desleixo que falei. Ele não tem a mínima preocupação com si mesmo, da alimentação à higiene.

Isso tira todo o STATUS de deus do cara que, bem, justamente por ser um, é retratado como o PRIMOR da forma física (só assistir à "Thor: Ragnarok" que tá lá, ele sem camisa só porque sim). E uma coisa legal: ele vai pra grande batalha daquele jeito mesmo. Dá um trato na barba e no cabelo, mas não emagrece nem nada. E isso é simplesmente MARAVILHOSO!

Isso é um momento tão legal e importante quanto o em que ele, no passado, revê sua mãe e desaba em choro ao assumir (pra si mesmo, inclusive) que está, sim, passando por um momento complicado, que teve crises de ansiedade. Poxa, o sorriso que ele dá quando o Mjölnir vem voando pra sua mão é empolgante! É, de verdade, inspirador.

Thor, apesar de tudo o que está passando, é digno de carregar o martelo. Com depressão, ansiedade, stress pós-traumático, todo desleixado... Ele é digno. Como eu sou digno. Como você é. Como todos nós somos. Como nenhuma dessas doenças nos diminui. DERRUBAM? Derrubam. Mas não nos definem.

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E o futuro?

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CONFESSO que não aguento mais filme de super-herói. Eu tou realmente cansado disso, toda essa coisa de precisar salvar o mundo, lutar contra um vilão e não sei mais o quê. Preferia um filme que conte mais histórias sobre as pessoas, numa escala muito menor. Mas, olha... Se rolar mesmo os "Asgardianos da Galáxia", que deve ser essencialmente um "Guardiões da Galáxia Vol.3" com o Thor, eu dou uma chance. O Thor merece se divertir um pouco, depois de tudo o que passou.

Ele abdicou do TRONO de (Nova) Asgard pra ser quem é. Pra buscar coisas que sejam mais significativas pra ele. E isso não é fácil, bicho. Largar a zona de conforto, tudo o que conhece e sempre sonhou, pra ir atrás da felicidade, aquela tal de verdade? Desafio de herói, né?

Mas é aquela coisa: se o Thor conseguiu, qualquer um consegue, né? :)

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