Vou te tirar dessa vida (quinto fragmento inédito do meu monólogo em pajubá)

A divisão entre putas, amantes e esposas é tema do monólogo hoje, assim como o discurso salvacionista dos travequeiros.

Ouça aqui:

Amara Moira em foto de Camila Gallate

A gente sendo só puta, vabene, amante é que as esposas não toleram. E quem dera fosse assim simples. Pode dar tchútcho, pode, a que era pra ser só puta vira amante e deixa de cobrar (fora quando não deixa também de lado o guanto, pra que guanto quando os dois se amam, né non?), aí a esposa e ela ainda me entram em guerra e o lixo, saco cheio das duas, vai atrás de outraxxx, porque uma ou, mesmo, duas nunca é o suficiente. Cioè, todo mundo se lasca, leva bonitão no toba. Por isso o profissionalismo é importante. É sexo que a gente vende? Então é sexo. Bato nessa tecla sempre, lembrar disso já me livrou de cada beó. O duro é quando não é bem sexo o que eles procuram, mas, sim, uma mãe, um divã, ou quando não misturam tudo e querem junto a mãe, a puta e a psicóloga. E nisso de ficar ouvindo, acolhendo, dando conselho, pronto, um pulo pra ela virar a amante, sonhando agora com o lugar de esposa, a escrava do lar. Tô fora. Rezo à minha santa deise todo dia pra me livrar desse enrosco. Ladrona da maricona delas, madona, tuto o que me faltava... como se a gente fosse um bando de desesperadas. Pior que alice é o que aqui mais tem e eu fico embabascada com isso. Eles vêm, pintam e bordam com a nossa cara, e depois ainda tem viado que cai no cunversê deles, "vou te tirar dessa vida", "a gente vai namorar", "vai casar", blablablar. Truque, né? Porque o namoro, o casamento mesmo que eles querem vale só no motel. Nem da recepção passa, se é que na recepção já não começa o disfarce, ele pedindo pra essa recém casada ser mais discreta, "vai que alguém vê". "Semana que vem a gente volta a se ver, amor", ele aí diz, e capaz que seja até antes, se ele ficar com tesão, ou nunca, se ele cansar dela. Uó! E a pobre puta cada vez mais pobre, porque deixa de cobrar e ainda usa horário de trabalho pra esses encontros furtivos. Isso quando, na cama, ela não faz a ativa, isso quando ela ainda não goza, toda inocente achando que só assim pra segurar o traste. É baixa alta-estima demais pro meu gosto, ah não. Os caras sentem tesão nisso de te salvar, verdadeiros heróis, se masturbam no carro dizendo isso pra bicha, ali antes de começar o pegê, e ela tem que segurar a mão deles, segurar real ou eles gozam. O problema? Oras, se os trastes tão ainda no carro e gozam, a chance de ficarem c'o aqüé é grande. Eles já nunca querem pagar, se isso é sucesso ainda, aí piora. Tenho um ódio quando isso acontece, vontade de batê tanto na cara deles! Tá pensando o quê? Tenho cara de palhaça agora? Vai pagar sim, gozou olhando pra mim, gozou tocando em mim, bora abrindo a carteira. Sabe o que é fazer a sereia? Nessas horas, é toda uma concentração babado, respirar fundo uma vez, duas, quantas for, pra não deixar que a Ariel encarne. Entra metade da travesti no carro, pela janela, ela puxando chave, tentando pegar carteira, celular, só os cambitinho de fora. Eu evito o máximo. Já fiz? Já fiz. Não me orgulho, só não sou hipócrita. Mas comemoro sempre que vejo um esquifoso se lascando assim. Morro de rir real. E, se quer saber como termina a história da horrorosa que se trancou no banheiro, quela nojenta esposa da maricona porca boca de esgoto, os dois pagaram bonitinho depois, pagaram até mais, o táxi inclusive, senão iam ver o escândalo. Só que depois dali, nunca mais quis saber de casal.

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Pra quem perdeu os outros fragmentos:

- Primeiro fragmento: "Travesti tomando tê"

- Segundo fragmento: "Golden shower"

- Terceiro fragmento: "Travesti Radioativa"

- Quarto fragmento: "Meu lado submissa falando"

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