Uma proposta de lei pode autorizar a comercialização de sangue, colocando em risco um sistema que funciona - e a saúde do povo

A PEC 10/2022, ou PEC do Plasma, é o hype do momento - e a gente explica tudinho pra você.

Parecia uma das mais generosas ações de fomento à coleta de sangue no Brasil quando, em junho de 2023, na cidade do Rio de Janeiro, a cantora Ludmilla desafiou seu fandom a realizar uma doação de sangue em troca de ingressos para assistir ao show da turnê Numanice (sucesso inquestionável). Uma legião de fãs doou, bancos de sangue foram abastecidos e vidas foram salvas.

Imagem: Twitter / @Ludmilla

Acontece que o Ministério Público vetou a reprodução desta mesma campanha em Vitória (ES), seguindo normas da Constituição Federal que proíbe todo tipo de comercialização de órgãos (incluindo sangue). Nada contra a iniciativa de Lud (que é genuinamente louvável), mas é que existe uma lei conhecida como Lei do Sangue (Lei 10.205/2001), que regulamenta esse artigo da Constituição Federal e ressalta que os princípios da doação devem ser o voluntariado e o altruísmo. Ela proíbe qualquer tipo de remuneração, ou seja, a doação não pode ser em troca de nenhum ganho ou benefício pessoal.

Tem gente colocando em xeque todo um sistema que funciona, é grátis e seguro: O senador Nelsinho Trad (PSD-MS), propôs via PEC (proposta de emenda constitucional) 10/2022, a autorização da coleta remunerada e comercialização de plasma sanguíneo.

Isso tramita no Senado Federal e está a partir de hoje em votação na CCJ para decidirem se o negócio vai ou não vai. O Ministério da Saúde se opôs à proposta e divulgou um material explicando que é importante garantir acesso igualitário e segurança rigorosa.

Publicidade

Divulgação / Ministério da Saúde

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, afirmou, em entrevista ao veículo JOTA, que a PEC do Plasma e suas propostas colocam em risco a segurança do sangue no país.

Ministra Nísia Trindade / Crédito: Julia Prado/MS

Isso porque está em jogo a qualidade e a disponibilidade para pessoas que precisam de transfusões ou de hemoderivados.

Atualmente, a Hemobras, estatal Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia, vinculada ao Ministério da Saúde, é a única responsável por pesquisar, desenvolver e produzir medicamentos hemoderivados e biotecnológicos para atender prioritariamente aos pacientes do Sistema Único de Saúde. A mesma empresa conta com parcerias em diversos atores privados na produção de hemoderivados (como imunoglobulina, fator VIII, entre outros). Estes insumos, por sua vez, são usados no tratamento de doenças tratadas somente pelo SUS. É esse gerenciamento único que permite a distribuição bem sucedida, acessível e sem distinção e custo para os brasileiros, afinal, já vivemos tempos em que a venda de sangue se tornou um grave problema social.

Na última terça-feira (3), o secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Complexo da Saúde, Carlos Gadelha, relembrou o cenário da década de 80, quando os brasileiros precisavam vender o próprio sangue para poder ter um prato de comida. Um tempo em que as pessoas mais pobres se prestavam a comercializar um bem tão precioso por valores irrisórios e com controles precários contra possíveis contaminações. Hoje em dia, o acesso à transfusão é disponibilizado com rigoroso critério de segurança.

Em se tratando só do plasma (um componente do sangue), a ideia da PEC é a extração por um aparelho chamado plasmaférese. Mas de acordo com o Ministério da Saúde, este procedimento pode reduzir as doações de sangue e a produção de outros hemocomponentes, comprometendo os estoques nacionais.

Publicidade

A PEC permite uma possível exportação de plasma, e isso prejudica a assistência ao nosso povo, principalmente quem tem hemofilia e problemas de coagulação, e pode deixar o Brasil vulnerável em casos de catástrofes ou emergências. Esqueça o apocalipse zumbi e foque em eventos como a última pandemia e o caos na saúde que vivemos nos anos 2020, 2021 e 2022.

Para evitar que o nossos sistema de armazenamento e distribuição - tão criticamente equilibrado - caiam em situação de calamidade, é importante acompanhar as discussões e votações que acontecem no Senado.

O Governo Federal já se posicionou contra a proposta, e a Ministra da Saúde deixou claro que a pasta vai trabalhar para que não seja comercializado nenhum órgão dos brasileiros.

A primeira reunião já aconteceu nesta quarta-feira (4), e passou o texto da relatora, a senadora Daniella Ribeiro (PSD). A partir de agora, a discussão segue para o Plenário do Senado, ainda sem data para aprovar. A proposta deve ser votada em 2 turnos e os lados contra e a favor vão trazer seus arsenais de argumentos para definirem o final dessa história. Estamos de olho.

E você, o que acha disso?

#PECdoPlasmaNÃO

Tô pensando aqui...

Publicidade

Veja também