Uma estudante projetou um absorvente interno que não abre cilindricamente, e eu nunca tinha pensado sobre o formato da minha vagina
Dizem que o absorvente interno foi criado por um homem que enfiou algodão em uma camisinha.

De acordo com a mitologia acerca da menstruação, o absorvente interno atual foi criado por um homem chamado John Williamson, que encheu uma camisinha com um material parecido com algodão. Seguindo esta lógica, eles foram criados no formato de um pênis, e não de uma vagina. Quando paramos para pensar nisso, eles se abrem cilindricamente. Mas a vagina é cilíndrica?


August / Nadya Okamoto
Conforme a história, Williamson trabalhava na Kimberly-Clark nos anos 1920. Quando ele apresentou a solução menstrual para o pai, consultor médico na mesma empresa, ele supostamente gritou: "Eu jamais colocaria algo tão estranho dentro de uma mulher!".
Apesar disso, segundo os registros de patentes, Earle Haas foi quem inventou, em 1931, o absorvente interno como conhecemos hoje. A primeira marca comercial foi a Tampax, que usava o design patenteado de Haas.
Nadya Okamoto, estudante de Harvard, queer, asiática-americana e co-fundadora da August, uma empresa de cuidados menstruais, levou esta questão para o TikTok e viralizou, explicando que projetou um absorvente interno que realmente se encaixasse na vagina e que não expandisse em formato cilíndrico.


Nadya Okamoto
Nadya também é co-fundadora da Period, uma organização global sem fins lucrativos que luta contra a pobreza e o estigma menstrual, e é autora do livro "Period Power".
Para esclarecer, as vaginas têm formatos, tamanhos e cores diferentes, mas estudos de imagem já comprovaram que a maior parte delas é mais estreita na abertura e mais larga no colo do útero. Isso faz com que ela tenha um formato em "V".
Supor que a vagina é como se fosse um estojo cilíndrico para um pênis não é absurdo. A palavra "vagina" significa literalmente "invólucro" em latim, enquanto "gladius" é uma gíria latina para "espada".
Além do design inovador, os absorventes internos e externos são produzidos com algodão 100% orgânico e são biodegradáveis em até 12 meses: um contraste gritante em relação aos absorventes tradicionais, que levam de 500 a 800 anos para se decompor, além de uma embalagem conter plástico pelo equivalente a de três a cinco sacolas plásticas. "Não usamos plástico neles e usamos cola própria para alimentos, então, mesmo grudando, é completamente absorvente", Nadya me contou.
Victoria Vouloumanos / BuzzFeed
"Nossas embalagens não são plásticas. São feitas a partir dos mesmos materiais que as sacolas compostáveis. Nossos aplicadores são recicláveis e livres de BPA. Além disso, nossa cadeia de fornecimento é neutra em carbono", continuou Nadya. (August também tem uma página de rastreamento para destacar isso).
Ela também reconhece que, apesar de haver copos menstruais, a comunidade expressou que prefere absorventes internos e externos, o que Nadya atribui a uma falta de conversa sobre cuidados menstruais, fazendo com que muitas pessoas que menstruam usem o que vêem sendo utilizado em casa. "Muito do que fazemos é ajudar as pessoas com o que elas já fazem, mas oferecendo versões mais sustentáveis, e continuando a falar sobre isso".
No ensino fundamental, muitas adolescentes já sabem esconder absorventes nas mangas ou no cós da calça. "Estamos condicionados a pensar que esse pequeno pedaço de algodão é tão vergonhoso que precisamos escondê-lo a todo custo, às vezes, até levando toda mochila para o banheiro. Ninguém nos diz para fazer isso, né?", destaca Nadya.


August / Nadya Okamoto
Nadya atribui a falta de ensino menstrual à educação sexual e mental incompreensiva nas escolas públicas, já que algumas escolas exigem autorização antes de discutir sobre o assunto, pois é considerado inapropriado.
Como resultado, Nadya acredita que o primeiro passo é conversar sobre sexo consensual, menstruação e puberdade de uma maneira real e compreensiva, incluindo tópicos como dores menstruais, TPM, miomas uterinos e endometriose, por exemplo, sem vídeos antiquados e constrangedores.
Francamente, os vídeos sobre educação menstrual não melhoraram muito desde 1946. Claro, a Disney não foi a primeira a colocar a menstruação como uma questão de higiene e discrição, as empresas de cuidados menstruais fazem esse mesmo marketing há décadas.


Kotex (Cellucotton Products Co.). 1926. Harper's Bazaar, 59(2561), pp. 135. / Via thecovaproject.com
"Essas marcas são responsáveis por perpetuar ainda mais esses estigmas acerca da menstruação", disse Nadya. "Eles vendem os itens principalmente para mulheres dizendo para que comprem seus produtos e, assim, esconder e esquecer que você está menstruada".
Naturalmente, a pobreza menstrual e o estigma podem ser suficientes para causar problemas à saúde mental, mas a própria menstruação também pode influenciar nisso. A menstruação é um ciclo completo com 4 fases, 28 dias (em média), em que os níveis de hormônio (incluindo o estrogênio, que está relacionado à serotonina) sofrem alterações. E, como Nadya destacou, "alterações de hormônio são iguais a alterações na saúde mental".


Nadya Okamoto
Ela explicou: "Existe uma ansiedade a respeito de menstruar, a TPM, as mudanças corporais, a dor, a acne, etc. Todos sabemos o que pode acontecer: ser pego de surpresa sem os produtos necessários e talvez passar vergonha por ter que caminhar em público com uma mancha de sangue visível".
No fundo, Nadya acredita que as marcas de produtos menstruais deveriam ter a responsabilidade de melhorar os cuidados e lutar contra o estigma menstrual. Essa crença fez com que ela projetasse um absorvente interno mais confortável e funcional e criasse produtos mais sustentáveis. Ela também criou uma plataforma digital para ajudar a criar uma comunidade segura para que as pessoas pudessem aprender sobre a menstruação.


August / Nadya Okamoto
O site fornece um banco de dados com respostas para perguntas sobre o assunto. "Quando você pergunta para alguém o que é necessário para a menstruação, ninguém responde que tem uma menstruação incrível e sem problemas", compartilhou Nadya.
"Se você acessar a plataforma e não encontrar a resposta que está procurando, pode enviar sua pergunta, e nós responderemos para você. Nós queremos criar um espaço coletivo em que podemos acrescentar informações sempre", adicionou.
"Independentemente de onde minha carreira me levar, eu sou apaixonada e fico empolgada por procurar alternativas para melhorar a qualidade da menstruação e acabar com a pobreza menstrual e o estigma", conclui Nadya.


Nadya Okamoto
Apesar da aceitação da sociedade da forma como a menstruação é tratada, muitos problemas, desde a educação até a pobreza menstrual, devem ser enfrentados, mesmo que seja só tirando um tempinho para pensar sobre o formato da sua vagina.
Este post foi traduzido do inglês.