Você sabe da importância do Teatro Experimental do Negro?

A companhia, voltada ao desenvolvimento e conscientização racial do negro brasileiro, inaugurou o teatro moderno brasileiro.

No dia 13 de outubro de 1944 foi fundado o Teatro Experimental do Negro, uma companhia teatral voltada à produção, desenvolvimento da cidadania e conscientização racial do negro brasileiro, por Abdias do Nascimento e Maria Nascimento.

O Teatro Experimental do Negro, Tom Jobim e Vinícius de Moraes na leitura da peça Orfeu da Conceição, em 1956 | Acervo O Globo.

Durante seu período de prisão na penitenciária do Carandiru, por consequência de seus protestos contra a discriminação racial (tempos da ditadura de Getúlio Vargas), Abdias criou o Teatro do Sentenciado. Deixando a prisão, veio a ideia de montar o Teatro Experimental do Negro, motivado pela ausência do negro nos debates nacionais e representações artísticas no Brasil, ao lado de sua esposa Maria.

Grupo de Mulheres do Teatro Experimental do Negro, 1946 | Reprodução

“Nossa cena vivia da reprodução de um teatro de marca portuguesa que em nada refletia uma estética emergente de nosso povo e de nossos valores de representação. Esta verificação reforçava a rejeição do negro como personagem e intérprete, e de sua vida própria, com peripécias específicas no campo sociocultural e religioso, como temática da

nossa literatura dramática.”

- Abdias do Nascimento

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A companhia era formada por uma equipe técnica, atrizes e atores oriundos das favelas, trabalhadores informais, empregadas domésticas e funcionários públicos de pequenos cargos.

Peça Todos os Filhos de Deus Têm Asas, com Ruth de Souza e Abdias Nascimento. | Acervo Ipeafro

Uma parte desse time foi alfabetizada ali mesmo. Aprenderam a ler e a escrever durante a formação das peças, para que pudessem decorar e entender os textos.

A estreia da primeira peça, “O Imperador Jones”, aconteceu em 8 de maio de 1945, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, onde uma pessoa negra nunca havia estado (fosse como artista ou público).

Anúncio da peça O Imperador Jones, em São Paulo. | Reprodução

Com o sucesso de crítica, o grupo passou a criar e encenar peças mais focadas no cotidiano afrobrasileiro.

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Fora dos palcos, o TEN também tinha uma postura política atuante. De lá saíram:

Ensaio da peça Sortilégio, com Abdias do Nascimento e Léa Garcia. | Reprodução

- Jornal Quilombo, que denunciava a situação do negro no Brasil e trazia notícias e fatos da negritude ao redor do mundo;

- Associação das Empregadas Domésticas;

- Conselho Nacional de Mulheres Negras;

- Semana do Negro;

- Comitê Democrático Afrobrasileiro;

- Convenção Nacional do Negro, que apresentou à constituinte de 1946 a inserção da discriminação racial como crime de lesa-pátria e outras propostas;

- Concurso de artes plásticas;

- Concursos de beleza para mulheres negras;

- A publicação dos livros “Sortilégio (Mistério Negro)” e “Teatro Experimental do Negro: Testemunhos”.

O trabalho do Teatro Experimental do Negro foi interrompido oficialmente em 1968, quando Abdias partiu exilado aos EUA, após a promulgação do AI-5, que endureceu ainda mais a ditadura militar brasileira.

A companhia deixou um legado que marcou todo o teatro e as artes brasileiras. Ao lado do grupo Os Comediantes, carregam o título de inauguradores do teatro moderno brasileiro. Grandes atrizes e atores como Ruth de Souza, Lea Garcia, Haroldo Costa e Aguinaldo de Oliveira saíram de lá. O Teatro Experimental do Negro também estimulou a consciência cidadã da negritude, a valorização da contribuição negra na formação do país e deixou uma marca na política, sociedade e cultura brasileira que reflete até os dias de hoje.

 Texto de Jun Alcantara.

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