Outra travesti no "BBB": o que mudou nesses 11 anos?

Após o circo que fizeram e as transfobias que Ariadna sofreu, o que acontecerá com Linn da Quebrada?

E onze anos depois de Ariadna no "BBB", eis que finalmente emplacaremos outra pessoa trans no famoso reality show. Quem é? Nada menos do que a multiartista Linn da Quebrada, que adora se definir como "terrorista de gênero". Muita coisa mudou de lá pra cá, e acho importante pontuarmos essas transformações, para entender o que esperar da nossa poderosa sister.

Reprodução/Globo

Começo dizendo que nunca, nunca, eu tive paciência ou mesmo vontade de assistir BBB e essa é a razão que me faz estar, ao mesmo tempo, triste e feliz com o anúncio da entrada da Linn. Eu finalmente terei que assistir esse programa. Não porque serei obrigada ou paga por isso, mas simplesmente porque a Linn é uma grande amiga e uma referência pra vida, motivos mais do que o suficiente para eu passar por cima de todas as minhas resistências ao programa.

No entanto, foi só assistir a abertura e já lembrei porque nunca consegui acompanhar antes: uma falação infernal, todo mundo querendo sobressair e parecer o bonzinho, o amigo, o legalzão do grupo, todo mundo elogiando as marcas patrocinadoras e, no meio de tudo isso, ainda as pérolas dos participantes. Confesso que talvez as pérolas tenham sido a única parte legal, o heterotop do bem, por exemplo, e que ficou todo constrangido quando levou uma cantada de um gay. Como não amar, não é mesmo?

Mas a decepção ficou por conta de descobrir que nossa terrorista de gênero favorita tá com covid e só fará a estreia quinta. Teremos que esperar, então, pra ver como será a sua recepção. Enquanto isso não acontece, aproveito para lembrar alguns pontos sobre a passagem da Ariadna no programa e as mudanças que podemos esperar para a edição atual.

Bom, em primeiro lugar, Ariadna entrou sem avisar para ninguém, dentro da casa, que era trans. A ideia do programa era justamente colocar uma pessoa trans no meio de pessoas cis e ver como elas reagiriam. Circo total. Detalhe: antes mesmo da estreia, o público já saberia que ela é trans, todo mundo alvoroçado querendo saber quão passável ela seria e se alguém na casa de fato perceberia.

Divulgação

O título de uma matéria da Veja de 10/01/2011 é bastante ilustrativo do circo que estavam armando: "Ariadna vai manter segredo sobre sua sexualidade no BBB". "Sexualidade", perceberam? Ela é hétero e, ao que tudo indica, parece uma hétero bem tradicionalzinha.

No entanto, na matéria temos uma fala do Boninho dizendo “Vai ser engraçado alguém pegar a moça que não é… rsrsrs”, imaginando que um dos homens da casa pode se interessar pela cabeleireira fluminense, sem saber que ela se tornou mulher após uma operação para mudança de sexo."

O circo, então, e todo mundo torcendo para que um homem cis ficasse caidinho por ela. A velha lógica do engano, a velha imaginação cisgênera de que estamos doidas pra enganar inocentes pessoas cis, "homossexualizá-las". Mas parece que o segredo não foi guardado por muito tempo, porque fingir ser cis é uma coisa cansativa e chata pra caramba. Aí, quando viram aquele mulherão que não tinha nenhum pudor pra falar de sexo e que conhecia intimamente o bajubá, língua criada pela cultura travesti (mas também de boa circulação entre bichas cis), os radares foram apitando e ela logo revelou ser trans.

Publicidade

Percebam: parece um obrigatório da nossa parte dizer que somos trans, sendo que nenhuma pessoa cis é cobrada de nada parecido. Precisamos dizer o que somos, para não sermos acusadas, depois, de termos enganado ninguém. A pessoa sente atração por nós e depois não consegue reconhecer isso nem pra si mesma, prefere nos acusar de engano, nos xingar, nos agredir. Tudo menos reconhecer a atração que ele próprio sentiu.

Divulgação/Globo

Bom, de qualquer forma, a Ariadna foi a primeira pessoa a ser eliminada da casa. Não sei bem os motivos. Como eu disse pra vocês, eu tinha enorme aversão a esse programa. Mas é simbólico que ela tenha sido a primeira. Será que foi eliminada por ter revelado que era trans e acabado com o entretenimento cisgênero da época, de ficar de butuca esperando o primeiro que ia cair na sua lábia? Será que foi eliminada por ser uma mulher que não tem pudor em falar de sexo, por conhecer bem os termos do bajubá? Se você acompanhou o "BBB" naquela época e quiser me dar umas infos a respeito, vou amar, aliás.

De qualquer forma, acredito que o tempo mudou e essa não vai ser a recepção da Linn. Hoje a gente já emplacou o significado das palavras "cis" e "transfobia", que à época nem o movimento LGBTQIA+ utilizava, hoje já temos um número gigante e crescente de influencer trans pra disputar a opinião pública e fazer bastante gente torcer pela Linn, hoje a gente não vai deixar barato nenhuma cachorrada ou cisice que fizerem com a nossa deusa.

Reprodução/Instagram

Tudo isso para deixar já registrado: vou, sim, com a minha coluna e redes sociais, passar todos os panos do mundo que a Linn precisar e, no que depender de mim e do meu feed, o prêmio de R$ 1,5 milhão já está garantido na poupança dela. Quer dizer, poupança não, porque tou aprendendo que esse é o pior investimento possível que alguém poderia fazer... mas essa é conversa pra outros carnavais.

Publicidade

Todo mundo ligado na estreia da nossa diva?

Veja também