Não podemos deixar que Armie Hammer volte do cancelamento

O ator, que foi acusado de abuso e estupro, não chega nem perto de se responsabilizar por seus atos sórdidos.

Aviso de gatilho: abuso, estupro e dependência química.

A primeira entrevista de Armie Hammer após inúmeras alegações de abusos foi absurda.

Armie Hammer at the People's Choice Awards
Armie Hammer at the People's Choice Awards

Todd Williamson / NBCU Photo Bank via Getty Images

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As acusações contra Hammer começaram em 2021, após uma série de mensagens do ator com conteúdo perturbador envolvendo fantasias violentas e canibalismo serem publicadas online.

Depois que as mensagens vazaram, sua ex Courtney Vucekovich disse ao site Page Six: “Ele fez algumas coisas comigo que não me deixaram confortável. Sabe-se lá por que, ele me convenceu de que essas coisas eram ok e me colocou em algumas situações perigosas. Ele bebia muito e isso me assustava. Não me sentia confortável.” Ela ainda descreveu Hammer como "assustador" e disse, "eu não estava segura". O representante de Hammer não respondeu às acusações, mas disse que as alegações eram "besteira."

Paige Lorenze, outra ex-namorada de Hammer, se pronunciou dizendo que Hammer cravou um "A" em sua pele e disse: "Suas ações e comportamentos são perigosos, além de emocionalmente e psicologicamente prejudiciais. Ele está dizendo que as pessoas estão julgando seus fetiches e que não deveriam comentar sobre sua vida sexual, mas o BDSM [Bondage, Disciplina, Dominação, Submissão, Sadismo e Masoquismo] é apenas um disfarce para o desejo dele machucar mulheres. É possível ficar traumatizado com sexo consensual. É inaceitável que ele convença as mulheres a deixá-lo machucá-las". O advogado de Hammer chamou as alegações de "falsas" e sustentou que "as interações com esta pessoa, ou qualquer parceira dele, foram completamente consensuais".

Hammer foi então acusado de estupro por uma mulher chamada Effie, que alegou um incidente em 2017. Hammer negou as acusações e afirmou que tudo foi consensual.

Ao escrever sobre Hammer, fiz questão de evitar os detalhes de seu suposto fetiche por canibalismo. Por uma boa razão: sinto que a cobertura de Hammer muitas vezes se concentra de forma lasciva no aspecto pervertido, sem explorar suficientemente as alegações subjacentes de que Hammer violou o consentimento das pessoas. Eu, francamente, não me importo se Hammer tem uma queda por dramatizações de canibalismo, mas me importo profundamente se ele abusou mulheres.

Falando pela primeira vez sobre as alegações em uma entrevista ao Air Mail , Hammer cita da boca para fora sobre ideias de consentimento sem explorar completamente suas próprias ações.

Close-up of Armie in a suit and tie
Close-up of Armie in a suit and tie

Gareth Cattermole / Getty Images

Ele reconhece que era “1 milhão por cento” emocionalmente abusivo e que “a dinâmica de poder era errada” em seus relacionamentos com “mulheres mais jovens, na casa dos 20 anos”. Ele admite que as drogas faziam parte de seu “estilo de vida intenso e extremo”, o que podia fazer as mulheres se sentirem “abandonadas ou usadas”. Esta entrevista era para ser o Hammer assumindo "responsabilidade" por suas ações.

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O fato é que Hammer afirma simultaneamente nunca ter feito sexo não-consensual (eu humildemente me pergunto se é possível insistir nisso após admitir que o relacionamento era desequilibrado e emocionalmente abusivo). Ele condena “essa cultura do cancelamento e galera ativista” dizendo “alguém comete um erro e nós jogamos a pessoa fora”.

Gregg DeGuire/FilmMagic

Sobre seu futuro em relação ao trabalho, ele diz: “Ninguém chega perto de mim porque se me contratarem, isso significa que eles apoiam abusadores, e então eles podem ser cancelados."

Indo mais à fundo nos detalhes (Hammer, como ele mesmo admitiu, abusou emocionalmente de mulheres) para o quadro mais amplo (o indefinível debate sobre “cultura do cancelamento”), Hammer minimiza suas próprias ações. O que devemos fazer com as pessoas que foram “canceladas”? Eu não faço ideia! O que devemos fazer especificamente com o Hammer? Eu argumentaria, no mínimo, que ele não deveria ter poder algum em Hollywood (mais sobre isso depois).

Ao longo da matéria, inúmeros pontos são alusivos à inocência de Hammer. O próprio Hammer diz que começou a se interessar por BDSM após sofrer abuso sexual na infância, algo pelo qual, obviamente, ninguém deveria passar. Não abordarei cada uma das frases do artigo, mas encorajo você tirar suas próprias conclusões e, se quiser, ler a matéria toda aqui. No entanto, eu queria abordar um aspecto em particular que chamou minha atenção.

A matéria afirma que "novas evidências" surgiram sobre as alegações de Effie que "exigem maior atenção". Suas mensagens sobre Hammer são descritas como “conflitantes”, como nas mensagens para a ex-esposa de Hammer, Elizabeth Chambers, onde ela diz que estava “praticamente o perseguindo” e que “continuava indo atrás dele”. (Nota: desde então, Effie postou supostas mensagens entre ela e Chambers, onde Effie escrevia: "Não era eu que estava indo atrás dele".)

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Além disso, Effie teria enviado DMs para seguidores do Instagram dizendo que o sexo com Hammer foi “consensual” dois dias antes de fazer as primeiras acusações contra ele.

Essa lógica ecoa o que o advogado de Hammer, Andrew Brettler, disse sobre as alegações de Effie após a entrevista coletiva em que Effie fez as alegações de estupro pela primeira vez: “A própria correspondência de Effie com o Sr. Hammer enfraquece e refuta suas alegações ultrajantes”.

O problema é que isso não refuta necessariamente o que Effie disse. “Tentei tanto justificar suas ações, a ponto de responder a ele de uma forma que não refletia meus verdadeiros sentimentos”, ela disse na entrevista coletiva mencionada. “Eu vivia com medo dele e tentei descartar suas ações como um tipo distorcido de amor. O abuso dele me traumatizou.”

É plausível que Effie minimize um evento traumatizante ao falar com a então esposa de Hammer ou com seguidores do seu Instagram. Lorenze recebe um tratamento semelhante por dizer uma vez que Hammer foi "realmente ótimo". Não existe uma “vítima perfeita”, e a implicação de que as vítimas devem se comportar de certa forma para serem consideradas verossímeis tem repercussões gravíssimas nos tribunais. É comum que as pessoas protejam seus agressores ou permaneçam em um relacionamento com eles. Essas mensagens não são prova de que essas mulheres estavam mentindo.

A segunda “evidência” é que Hammer rompeu o músculo peitoral enquanto puxava pesos no início de janeiro de 2017, o que é usado para “questionar” se ele teria sido “fisicamente capaz” de cometer um estupro violento em abril. Hammer é acusado de ter estuprado Effie por “mais de quatro horas”, durante as quais ele supostamente “bateu a cabeça dela contra a parede, deixando hematomas em seu rosto e chicoteou os pés dela para que doessem a cada passo.”

Armie with his hand raised
Armie with his hand raised

Anadolu Agency / Getty Images

De fato, os registros médicos obtidos pela publicação mostram que Hammer fez fisioterapia no dia anterior e no dia seguinte ao suposto estupro. O médico citado ainda diz que a reabilitação para tal lesão seria entre quatro e seis meses, o que está perfeitamente dentro do prazo. O artigo não menciona, no entanto, que no mesmo mês, Hammer foi fotografado viajando para a Rússia, participou da estréia do filme "Free Fire: e foi entrevistado no "Jimmy Kimmel Live" e no "The Late Late Show With James Corden" – o que sugere bastante movimento físico da parte dele.

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Effie negou vigorosamente o relato de Hammer.

É importante considerar o tom da matéria e os próprios comentários de Hammer. Isso sugere que a situação dele é apenas resultado do movimento #MeToo indo longe demais, uma mensagem que descobri vir acompanhada por uma quantidade impressionante de medo.

De acordo com o escritor, o “aspecto mais impressionante da narrativa que se formou sobre Armie Hammer… é o pouco escrutínio que essas alegações chocantes receberam”. A mídia é chamada para relatar alegações “fantásticas” “com total credulidade”. Mais de uma vez, o sexo com fetiche é comparado a ser gay.

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Ao ler a matéria, fiquei impressionada com as semelhanças entre Hammer e outra celebridade acusada de cometer abusos: Shia LaBeouf.

Close-up of Shia
Close-up of Shia

Emma Mcintyre / Getty Images for HFA

LaBeouf, assim como Hammer, admitiu que "pisou na bola" e "machucou" uma mulher (provavelmente FKA Twigs), tudo isso mantendo sua inocência criminal. “Quando olho para esse ambiente do #MeToo, não há muitos caras que assumem a responsabilidade”, ele disse em agosto de 2022. “Acho que agora o meu propósito é não fazer como os outros exemplos que temos sobre como navegar algo desse tipo - que é ir atrás da mulher, ou tentar ganhar um processo judicial, ou voltar para a porra de um filme, ou, tipo, sequer voltar."

O julgamento do processo de FKA Twigs contra LaBeouf começará dia 17 de abril de 2023.

Eu, sinceramente, desejo a Hammer uma vida sóbria. Mas dizer que você é um “idiota” não é a mesma coisa que assumir a responsabilidade total e aceitar as consequências.

Sim, consequências reais. A vida não deve a ninguém o papel de estrela de cinema. Hammer, por sua própria admissão, abusou emocionalmente de mulheres mais jovens durante o auge de seu poder. Isso por si só me diz que este não é um homem a quem devemos confiar mais poder, e essa não é a “galera ativista” indo atrás de Hammer. Pelo amor de Deus, você não pode machucar as pessoas e esperar que nada aconteça.

Hammer não está buscando um retorno público, pelo menos ainda não (ênfase no "ainda", a matéria afirma que ele "adoraria a oportunidade de retornar"). De acordo com o Air Mail, o diretor de "Me Chame Pelo Seu Nome", Luca Guadagnino, disse recentemente que “mal pode esperar para trabalhar com Armie assim que tiver um grande papel para ele”. Ele não está totalmente desprovido de apoiadores, e algumas pessoas passaram a usar a hashtag #SupportArmieHammer, em português "apoie Armie Hammer", após a publicação do artigo.

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Robert Downey Jr. foi conectado a um possível retorno de Hammer, já que ele supostamente pagou por quase seis meses de reabilitação para Hammer. O próprio Hammer disse no artigo do Air Mail: “Há exemplos em todos os lugares, Robert sendo um deles, de pessoas que passaram por essas coisas e encontraram a redenção por um novo caminho”.

O tempo dirá como as possíveis tentativas da volta de Hammer à indústria serão recebidas.

Se você, ou alguém que você conhece, sofreu algum tipo de abuso sexual, não hesite em buscar ajuda nos seguintes números: 191, 180, 100. O Ligue 180 é um serviço de utilidade pública essencial para o enfrentamento à violência contra a mulher. O Disque Direitos Humanos (Disque 100) é um serviço de disseminação de informações sobre direitos de grupos vulneráveis e de denúncias de violações de direitos humanos.

Se você ou alguém que você conhece sofre com dependência química, disque Recomeço 0800 227 2863 ou entre em contato com o AA por Whatsapp, telefone ou email.

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