Assédio sexual no governo: Mulheres denunciam o presidente da Caixa, Pedro Guimarães

Nas redes sociais, as pessoas cobram a demissão do auxiliar de Jair Bolsonaro (PL).

BuzzShe

Um integrante do alto escalão do governo de Jair Bolsonaro (PL) está sendo investigado no Ministério Público Federal (MPF) por assédio sexual.

Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Um grupo de funcionárias da Caixa Econômica Federal relatam que o presidente do banco, Pedro Guimarães, teria feito toques íntimos não autorizados, abordagens inadequadas e convites inapropriados a elas em diversas situações.

Isac Nóbrega/PR

Vários dos testemunhos estão relacionados a viagens a trabalho. Ao menos uma das funcionárias conta que passa por crises de pânico e ansiedade quando precisa ir a essas viagens.

Publicidade

O caso foi revelado em reportagem do site Metrópoles, que ouviu cinco dessas mulheres: Cristina, Beatriz, Ana, Thaís e Valéria – todas sob pseudônimo para não serem identificadas.

Hector Roqueta Rivero/ Getty Images

Algumas delas já depuseram oficialmente ao MPF na investigação que está sob sigilo. Outras, devem fazê-lo em breve.

Pedro Guimarães não respondeu pontualmente às perguntas sobre as denúncias feitas pelo site. A Caixa enviou uma nota sobre o caso e disse não ter conhecimento sobre as acusações. O texto está no final desta matéria.

Economista, Guimarães assumiu a presidência do banco público em janeiro em 2019. Desde então, tornou-se um dos integrantes do governo mais próximos a Bolsonaro, sendo presença assídua nas "lives de quinta" do presidente e em eventos oficiais.

Reprodução/Youtube

Publicidade

Publicidade

Abaixo, reproduziremos alguns dos relatos feitos pelas funcionárias sobre os episódios de assédio de Pedro Guimarães.

thesamphotography/ via Getty images

Cristina.

“Sempre tem perguntas do tipo: ‘quero saber se você está comigo ou não, se eu posso contar com você’”, conta a funcionária. 

Durante jantar em uma viagem ao Nordeste, ela conta que Guimarães teria proposto "fazer um carnaval fora de época". "Ninguém vai ser de ninguém. E vai ser com todo mundo nu", teria dito o presidente da Caixa.

Na ocasião, Cristina conta: "Ele me falou: 'Vou te rasgar. Vai sangrar'".

Ainda durante o jantar, ele teria começado a "arranjar casais". "Ele dizia, apontando para nós: ‘nessa viagem fulano vai pegar você, beltrano vai pegar você’. Foi nojento", diz. Outras pessoas que estavam à mesa confirmaram o relato, também sob anonimato.

Após o jantar, Guimarães levou uma parte do grupo até a areia da praia e propôs que todos entrassem no mar para tirar uma foto.

"Na hora, ele derrubou a gente na água. Ficamos no mar por um tempo, e ele ficava circulando entre os grupos. De vez em quando, ele aparecia do meu lado. Teve uma hora em que ele chegou e perguntou: ‘Você confia em mim? Confia na minha gestão? Você está comigo agora. Vem cá, me abraça”, conta. E segue: “Aí ele disse: me abraça direito, porra. E deu umas catracadas, e passou a mão em mim. Na hora de tirar a mão, passou a mão no meu peito”.

Publicidade

Valéria.

Segundo Valéria, as mulheres escolhidas para as viagens têm um certo padrão de beleza. “Tem um padrão. Mulher bonita é sempre escolhida para viajar”. E segue: “Ele convida para as viagens as mulheres que acha interessantes”.

Ela aponta que Guimarães age com a ideia de que quem aceita as investidas pode ganhar vantagens na carreira. “É um conceito deturpado de meritocracia. Para ele, meritocracia é atendê-lo”.

Valéria também esteve na viagem ao Nordeste que terminou com funcionários sendo empurrados no mar na ida à praia para uma foto. “Eu estava com a roupa molhada. Ele chegou perto, disse que gostava muito de mim, perguntou se eu estava feliz e passou a mão na minha bunda”, conta. “Foi uma mãozona. Ali, ficou muito claro (o assédio). Foi como se ele dissesse: ‘Se você der para mim, você vai ser promovida’”, diz.

Beatriz.

A funcionária diz já ter sido convidada para nadar e para ir ao quarto do chefe. “Ele falou assim: ‘Vai lá, toma um banho e vem aqui depois para a gente conversar sobre sua carreira’. Não entendi. Na porta do quarto dele. Ele do lado de dentro (do quarto) e eu um metro para fora. Falei assim: ‘Depois a gente conversa, presidente’. Achei aquilo um absurdo. Não ia entrar no quarto dele. Fui para meu quarto e entrei em pânico”.

Em outra ocasião, ao atender o chamado, a funcionária encontrou Guimarães de samba-canção: “Ele abriu a porta com um short, parecia que estava sem cueca. Não estava decente. A sensação que tinha era que estava sem (cueca). Muito ruim a sensação.”

Os episódios tiraram o sossego da mulher no trabalho. “Tenho pânico de ter que trabalhar com ele. Tenho medo da pessoa. Agora eu tento literalmente me esconder nas agendas”, conta. “Agora, quando viajo, coloco cadeira na porta do quarto. Fico com medo de alguém bater.”

Durante uma viagem ao Sudeste, Beatriz conta que Guimarães avançou o sinal de forma ainda mais explícita, quando eles deixavam o salão onde ele havia jantado. “Ele passou a mão em mim. Foi um absurdo. Ele apertou minha bunda. Literalmente isso”, relata. “Nunca precisei disso na minha vida para ganhar cargo. Prefiro até não ter cargo, mas nunca precisei disso, afirma”.

Para fugir do assédio do chefe, ela procurou a ajuda de um colega de trabalho, embora não tenha revelado a ele o ocorrido. “Falei com esse colega: ‘Fica aqui falando comigo’. Ele respondeu que não estava entendendo nada. Eu disse: ‘Não me solta, só fica conversando, como se nada tivesse acontecido. Finge que estou tratando alguma coisa com você. Nem olhei para trás”.

"Hoje ainda trabalho nas agendas de vez em quando. Mas tento não ficar perto. Quando tenho que viajar, tenho crise de ansiedade”, conta.

Publicidade

Ana:

Ana diz ter a impressão de que Guimarães sente-se dono de algumas mulheres que o rodeiam. “É comum ele pegar na cintura, pegar no pescoço. Já aconteceu comigo e com várias colegas”, diz. “Ele trata as mulheres que estão perto como se fossem dele.”

Mesmo diante do não das mulheres, ela diz que ele insiste. “Ele já tentou várias vezes avançar o sinal comigo. É uma pessoa que não sabe escutar não”, conta. “Quando escuta, vira a cara e passa a ignorar. Quando me encontrava, nem me cumprimentava mais”.

Por muito tempo, ponto comum entre as mulheres foi o medo de denunciar o chefe. “Quando ele percebe que tem algum caso que representa risco, chama para perto, mantém a mulher por perto. Ou então pede às pessoas próximas para que elas sejam observadas”, afirma.

Thaís.

Thaís já foi convidada por Guimarães para ir à sauna e conta já ter recebido um beliscão do presidente da Caixa. Ambas as situações ocorreram durante uma viagem. “A posição em que ele se coloca deixa as mulheres muito constrangidas. Se ele tem o poder, você tem que fazer, tem que fazer o que ele mandar, independentemente do que seja”. Ela segue: “Ele chega de forma muita invasiva e constrangedora”.

A funcionária conta que durante uma viagem, o chefe pediu que ela guardasse um cartão e o telefone celular dele, mesmo ela já carregando um presente recebido por ele. “Ele veio com o cartão de acesso do quarto e o celular, querendo que eu guardasse. Eu falei: ‘Presidente, minha mão está ocupada”, relata. “Ele veio e enfiou o celular e o cartão no meu bolso e falou: ‘Eu vou botar aí na frente’. Na hora, não tive reação. Pensei: ‘Botar na frente? Fiquei meio assim…”, afirma. “Foi nessa mesma viagem que, mais tarde, ele me chamou para ir para a sauna”.

Ela também falou sobre o medo de denunciar o chefe: “A gente tinha muito receio, porque a corda arrebenta sempre do lado mais fraco, porque em qualquer lugar em que vá essa denúncia ele pode ter um infiltrado. E isso afeta o resto do meu encarreiramento, no aspecto profissional. Então, era melhor esperar passar”, afirma Thaís. “Noventa por cento das mulheres não vão falar porque ele tem poder”, diz.

Publicidade

Em nota, a Caixa disse:

“A Caixa não tem conhecimento das denúncias apresentadas pelo veículo. A Caixa esclarece que adota medidas de eliminação de condutas relacionadas a qualquer tipo de assédio. O banco possui um sólido sistema de integridade, ancorado na observância dos diversos protocolos de prevenção, ao Código de Ética e ao de Conduta, que vedam a prática de ‘qualquer tipo de assédio, mediante conduta verbal ou física de humilhação, coação ou ameaça’. A Caixa possui, ainda, canal de denúncias, por meio do qual são apuradas quaisquer supostas irregularidades atribuídas à conduta de qualquer empregado, independente da função hierárquica, que garante o anonimato, o sigilo e o correto processamento das denúncias. Ademais, todo empregado do banco participa da ação educacional sobre Ética e Conduta na Caixa, da reunião anual sobre Código de Ética na sua Unidade, bem como deve assinar o Termo de Ciência de Ética, por meio dos canais internos. A Caixa possui, ainda, a cartilha ‘Promovendo um Ambiente de Trabalho Saudável’, que visa contribuir para a prevenção do assédio de forma ampla, com conteúdo informativo sobre esse tipo de prática, auxiliando na conscientização, reflexão, prevenção e promoção de um ambiente de trabalho saudável.”

Veja também