Minha vida seria diferente sem a sua opinião sobre o meu cabelo

Como um comentário sobre tranças feito no BBB levantou questões sobre a minha autoestima.

Há alguns dias no "BBB 21", Camilla de Lucas resolveu mudar o visual e tirar suas tranças. Durante o processo, Sarah fez o seguinte comentário: "Quando eu era criança meu sonho era fazer trancinha assim, mas minha mãe falava que iria estragar meu cabelo. Agora eu sou famosa, posso fazer. Até então, eu tinha uma profissão. Imagina chegar para trabalhar em uma multinacional usando tranças? As pessoas iam me olhar e pensar: ‘como assim?'"

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O mundo corporativo já foi e continua sendo um cenário de terror para muitas mulheres negras quando o assunto é mudar o cabelo. Ousar com um novo penteado não é apenas estar em dia com a autoestima, mas também se preparar para uma avalanche de piadas e comentários que apagam horas e horas de trabalho sentada numa cadeira pra encontrar o seu novo eu daquela semana.

O ritual é sempre o mesmo: bater o cartão na chegada, respirar fundo e se olhar mil vezes em algum espelho repetindo o mantra: "Eles vão rir, mas eu vejo beleza no que o espelho reflete e isso basta pra mim."

Nem sempre funciona. Uma risada, um olhar ou um cochicho entre os colegas se tornam um verdadeiro combo do desequilíbrio que te afeta o resto do expediente. E no dia seguinte, você aparece com um lenço na cabeça pra agradar os olhos alheios e deixar de ser um alvo.

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Desde cedo as mulheres são condicionadas a sentir uma constante necessidade de aprovação, e as mulheres negras já crescem sabendo que o simples fato delas existirem e serem percebidas é uma fadiga diária. Se mostrar forte num universo que te enfraquece é cansativo.

Essas queixas se encontraram pela internet mundo afora, mas eu entendi que essas tentativas de humilhação são inúteis e que a única aprovação relevante é a que eu determino pra mim mesma.

E caso esteja se perguntando: sim, você que é o desconstruído do rolê já pode ter facilmente sido o babaca que desestruturou, invalidou e silenciou a beleza de alguém, única e exclusivamente por conta de um gosto pessoal normativo e eurocêntrico.

Se você já pegou no cabelo de uma pessoa negra sem sua permissão, a chamou por apelidos ligados a personagens caricatos ou estereotipados e depois tentou aliviar com um "TÔ ZUANDO!", ou até mesmo fez um "elogio" muito sutil na linha "que penteado lindo, mas em mim ficaria parecendo uma palhaça": sim, você aplicou o racismo recreativo a partir do que você chama de brincadeira, mas que, para nós, é uma ofensa bem escrota.

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Não existem palavras leves e bonitas para dizer aquelas coisas que nos atingem em cheio. Criar argumentos e justificativas para se esquivar dessa culpa nos dias de hoje é burrice.

A construção da autoestima das nossas crianças precisa ser regada a sorrisos que não surgem a partir de piadas ofensivas. Somos muitas desde sempre, e nosso processo de aceitação está ligado ao legado de nossas ancestrais. Para nós, resta a certeza de que o espelho sempre esteve certo.

Stella Yeshua, autora do texto.

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