Este cientista inventou um hambúrguer vegano que "sangra"

Em breve, no cardápio de três restaurantes na Califórnia (EUA).

Jess Misener / BuzzFeed

O "sangue" é, na verdade, uma molécula à base de ferro que a Impossible Foods extrai da soja.

Há seis anos, Pat Brown era um cientista que estava de licença sabática. O bioquímico da Universidade Stanford já tinha estudado como os genes se expressavam no câncer, inventado microchips que ajudaram na pesquisa genética e ganhado títulos de prestígio, inclusive como membro da Academia Nacional de Ciências dos EUA.

No entanto, durante sua folga, Brown decidiu que queria concentrar sua energia fora da universidade e resolver o que ele chama de "o problema mais importante no mundo no qual acho que eu posso ajudar": alimentos de origem animal.

Brown, que é vegano, acredita que a carne e os laticínios impõem um fardo desnecessário aos recursos naturais, do solo à água, e que alternativas vegetais, se corretamente executadas, podem ser mais sustentáveis — e, talvez, igualmente saborosas.

Publicidade

Impossible Foods

Pat Brown, fundador e presidente da Impossible Foods

Brown acabou deixando seu "emprego dos sonhos" em Stanford para fundar em 2011 a Impossible Foods, uma start-up de alimentos veganos com 130 funcionários, cujo primeiro produto é o Impossible Burger, um hambúrguer sem carne mas que é igual à carne.

Após estrear no restaurante David Chang’s Momofuku Nishi, na cidade de Nova York (EUA), em julho, a empresa disse que, a partir desta quinta-feira (20), o hambúrguer estará no cardápio de três restaurantes da Califórnia: o Jardinière e o Cockscomb, em São Francisco, e o Crossroads Kitchen, em Los Angeles.

Este não é um hambúrguer como os feitos de tofu ou de hortaliças. Os seus ingredientes incluem água, trigo, óleo de coco, soja, proteínas da batata e um caldo exclusivo de aminoácidos e açúcares. O componente principal, que a empresa diz estar sujeito a várias patentes pendentes, é o "heme" — uma molécula composta por ferro e que pode ser extraída de raízes de plantas fixadoras de nitrogênio, como a soja. (Também é ela que deixa o seu sangue vermelho e o hambúrguer rosado)

"Se você parar para pensar, os animais são apenas uma tecnologia que transformam plantas em carne e laticínios", disse Brown.

"Mas eles não evoluíram para essa função e, na verdade, não são muito bons nisso. Tivemos a oportunidade de analisar esse problema com uma nova perspectiva e dizer: 'OK, se você estivesse em 2016 tentando pensar na melhor maneira de tornar esses alimentos sustentáveis, acessíveis, deliciosos, nutritivos e por aí vai, como você faria isso?' Bem, a última coisa que você pensaria é: 'Vamos simplesmente colocar plantas dentro dos animais, matá-los e comê-los'".

Publicidade

Impossible Foods

A meta não é necessariamente apelar aos vegetarianos, mas aos carnívoros que gostam do gosto da carne e que, por motivos de saúde ou ambientais, estão pensando em abandonar ou diminuir este consumo.

Brown afirma que, comparado a um hambúrguer bovino, a produção do Impossible Burger usa 74% menos água, além de emitir 87% menos gases estufa. Ele também é livre de antibióticos, carboidratos, aromatizantes artificiais e hormônios, e sua gordura vem do óleo de coco, de acordo com a empresa.

"As pessoas do mundo todo adoram carne, peixe e laticínios", disse Brown. "Elas realmente não vão parar de ingeri-los e, de fato, a demanda por esses alimentos tem disparado".

Os hambúrgueres são produzidos no laboratório da Impossible Foods. Nele, doutores em jalecos brancos passam seus dias debruçados sobre moléculas que compõem a textura, o sabor, a cor e o aroma da carne. Como replicar a experiência de passar um hambúrguer de rosado a dourado em uma chapa? Como ter certeza de que ele fique úmido e firme, mas não úmido e firme demais?

Publicidade

Stephanie M. Lee / BuzzFeed News

Para um crítico do BuzzFeed que sempre foi vegetariano, que não gosta do gosto da carne e que nunca comeu um hambúrguer "de verdade", o Impossible Burger foi visceralmente repulsivo. Em sabor e textura, a semelhança com carne de verdade foi tão forte que comer o produto provocou uma dissonância cognitiva bizarra. No entanto, na perspectiva de um carnívoro, foi bem parecido com comer um hambúrguer de verdade, apesar de ele ser um pouco mais macio e mais propenso a se desmanchar do que geralmente é o caso com carne de verdade.

Apesar dessas questões exigirem soluções complexas em biologia molecular e bioquímica, a empresa, que está sediada no Vale do Silício, também tem uma conexão forte com o mundo da tecnologia.

Seus 182 milhões de dólares em financiamento vêm de investidores como Khosla Ventures, Bill Gates e Google Ventures, assim como a Horizons Ventures, do magnata Li Ka-Shing de Hong Kong, UBS e Viking Global Investors. O Google até tentou comprar a Impossible Foods por entre 200 e 300 milhões de dólares, segundo o The Information, em 2015, mas a negociação não deu certo porque a start-up queria mais dinheiro.

A Impossible Foods não está sozinha. Seus rivais já estão cultivando células animais para produzir alimentos e roupas. A Beyond Meat, concorrente de Los Angeles, tem a vantagem de já ter começado há alguns anos a vender tiras de carne e frango e carne moída à base de proteína vegetal para mercados em todos os EUA. Neste ano, ela está começando a vender seu próprio hambúrguer vegetal, o Beyond Burger (que contém ingredientes diferentes, não incluindo heme) em mercados, em vez de restaurantes. Brown disse que a Impossible Foods está entrando primeiro em restaurantes numa tentativa de apresentar o produto ao maior número de pessoas possível.

Publicidade

Stephanie M. Lee / BuzzFeed News

O Impossible Burger

Logo após o Impossible Burger, a Impossible Foods quer trabalhar em produtos que simulem carne de frango, porco, peixe e laticínios. Um desafio em potencial, no entanto, é o custo de produção. O hambúrguer (com batatas fritas) custará 18 dólares no Jardinière, 20 no Cockscomb e 14 no Crossroads Kitchens — preços claramente voltados a uma clientela endinheirada.

Brown disse que espera que seu custo de produção caia em dois ou três anos, à medida que o processo de produção seja ampliado. Para aumentar a escala, "não precisamos de descobertas, invenções, inovações", disse, "apenas engenharia inteligente — e dinheiro, porque produzir qualquer substância física em uma escala muito grande exige muito capital".

Publicidade


Publicidade

Veja também