Ao menos 559 escolas, ruas e obras ainda homenageiam ditadores brasileiros

Escola Municipal Ernersto Geisel, Rua Presidente Arthur da Costa e Silva... Em pleno 2021.

Entre 1972 e 1974, a ditadura do brasileiro Emílio Garrastazu Médici realizou a Guerrilha do Araguaia. Nela, ao menos 118 pessoas que lutavam pelo fim da ditadura militar nos arredores de Xambioá (TO) foram torturadas e mortas. Perto dali, hoje, o nome do algoz é reverenciado para crianças de 6 a 15 anos. 

Castelo Branco recebendo saudações militares. Foto: Universal History Archive/UIG via Getty images

A Escola Municipal Presidente Medici, de Dom Eliseu (PA), fica a cerca de 250 km do local onde ocorreu o massacre. 

47 anos após o ocorrido, enquanto os pequenos entram na construção com o nome do assassino, 50 famílias ainda não encontraram os corpos dos parentes executados na ação.

Histórias como essas estão longe de serem exceções. No nosso país há, pelo menos, 559 locais batizados em homenagem a ditadores militares brasileiros.

Fachada do Colégio Municipal Presidente Castelo Branco, em Paraí (RJ) Foto: Reprodução - Facebook/ @Castelinho2

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Todos os estados do país possuem ao menos uma homenagem aos tiranos.

Reprodução / Ditamapa

Quem mostra isso, é a dupla Giselle Beiguelman e Andrey Koens.

Respectivamente: professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e mestrando em Artes Visuais no Instituto de Artes da UNESP, eles colocaram no ar o site Ditamapa.

A página mapeia locais que levam o nome de algum dos seis ditadores militares brasileiros.  "Ruas são como rugas das cidades. É essa, aliás, a origem latina da palavra 'rua' -- ruga. Sulcos da passagem do tempo e dos acontecimentos, as ruas funcionam como lugares da memória. No caso particular do Ditamapa, enunciam, pelos seus nomes, a presença dos fantasmas do autoritarismo", afirmam.

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O levantamento permite verificar que as homenagens são, constantemente, feitas em regiões próximas de locais atacados pelos ditadores.

Reprodução / Google Maps

A carioca Avenida Presidente Médici, por exemplo, fica a menos de 8km do Instituto Oswaldo Cruz.

Muito antes da vacina contra o corona, o local foi palco do "Massacre de Manguinhos", onde o déspota cassou os direitos de alguns dos principais cientistas do Brasil.

O exemplo mais famoso, no entanto, talvez seja de Brasília. E, claro, envolve Jair Bolsonaro.

Ponte Costa e Silva / Foto: Montagem sob imagem de Nevinho / Wikimedia Commons

Inaugurada em 1976, Niemeyer batizou de "Ponte Monumental" uma das quatro alças que passam por cima do Lago Paranoá, em Brasília. O ditador da época, no entanto, não curtiu. Ernesto Geisel preferiu homenagear o responsável pelo AI-5 e colocou o nome de Costa e Silva. 

Em 2015, uma lei distrital mudou o nome para Ponte Honestino Guimarães - por conta do líder estudantil que desapareceu nas mãos do governo de Silva.

Em 2018, 10 dias depois da eleição de Bolsonaro, a decisão foi revertida e a ponte voltou a ser chamada como o ditador. Na época, Bia Kicis - fiel apoiadora bolsonarista - deu entrevistas afirmando: "Acabamos de ganhar uma ação importantíssima, porque ela representa que os comunistas não passarão". 

A ponte com o nome do ditador fica a menos de 5km do Planalto.

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O projeto revelou que o ditador mais homenageado é justamente Costa e Silva. São 184 logradouros públicos com o nome do tirano espalhados por 20 dos nossos estados.

R. Presidente Arthur da Costa e Silva, Maringá (PR). Foto: Reprodução / Ditamapa

Depois, temos respectivamente Castelo Branco, Médici, Geisel e Figueiredo. Todos no pódio dos autocratas mais queridinhos dos nossos mapas.

R. Ernesto Geisel, Barreiras (BA). Foto: Reprodução / Ditamapa

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O Ditamapa ainda conta com uma aba chamada "Postais do Atraso", que usa imagens do Google Maps para criar retratos lindos de espaços com nomes tenebrosos.

Reprodução / Ditamapa

Dá pra passar horas no site, vendo se tem algum lugar perto de você cujo nome precisa ser repensado. Vale dar uma olhada.

Homem sendo carregado após ferimentos em protesto de 1968. Foto: Wikimedia Commons

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Há como mudar isso: se organize para pedir requerimentos para alterar o nome. Vereadores da câmara municipal de sua cidade têm o poder de alterar a alcunha.

R. Ernesto Médici, Bagé, (RS). Foto: Reprodução / Ditamapa

Lugar de nome de ditador é no lixo da história.

Protesto em São Paulo. Foto de 2019 por: Fabio Vieira/FotoRua/NurPhoto via Getty Images

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