Alunas relatam ter sido ignoradas ao denunciarem casos de assédio em um dos maiores colégios do Rio

Colégio que se apresenta como "o melhor desempenho no ENEM do Rio de Janeiro", foi parar no Trending Topics com a hashtag #AssedioÉHabitoNoPensi; assessoria afirma que todas as denúncias sempre foram apuradas.

O Colégio Pensi, que se apresenta como o melhor colégio no ENEM do Rio De Janeiro, foi parar no topo dos tópicos mais comentados no Twitter na última sexta com a hashtag #AssedioÉHabitoNoPensi.

Reprodução / Twitter

O Twitter chegou a contabilizar mais de 46 mil tuítes sobre o assunto na tarde da última sexta-feira (16).

Dentro da hashtag, havia relatos de assédio em diversas unidades do colégio. Conseguimos entrar em contato com algumas das alunas e aqui estão seus relatos.

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"Então, ele virou pra mim, apontou e disse diante da sala toda: 'E você, loirinha, consegue fazer com três sem tirar de dentro?'".

Reprodução / Twitter / Via Twitter: @_gabluna

"Um professor estava lendo o enunciado e pediu para os alunos responderem às três questões seguintes. Então, ele virou pra mim, apontou e disse diante da sala toda: 'E você, loirinha, consegue fazer com três sem tirar de dentro?'. A minha reação foi sair de sala e chorar.

Quando comuniquei à coordenação sobre o ocorrido, eles conversaram com o professor, que negou até a morte. Usou a desculpa de que tinha dirigido a frase a um menino da sala e que tinha dito 'loirinho' em vez de 'loirinha', o que não é verdade, pois tenho testemunhas.

Para vocês terem uma noção, coordenadores e diretores na época vieram conversar comigo a fim de indiretamente pedir para não processá-lo. O professor, mesmo, nunca veio falar comigo nem pedir desculpas. No dia seguinte, meus pais foram ao colégio, e eles disseram que a questão seria passada para um nível acima deles, mas, no final, o que aconteceu foi que eles optaram por manter este professor.

Depois disso, o comportamento dele mudou na nossa classe, mas eu fiquei sabendo por amigas minhas de outras unidades que ele faz piadas irônicas sobre a situação. Por exemplo, ele elogia alguma menina e logo depois pede desculpas. Ou, quando "brinca" com alguém, já emenda dizendo: 'não vai me processar não, né?'

Toda semana quando ele entra na sala minha vontade é de sair da sala. Eu passei de uma aluna que ele nem conhecia para uma aluna que ele parece que ele tem medo. Eu não queria isso, só queria ser respeitada. Eu imaginava o meu terceiro ano como um ano decisivo, que eu seria incentivada a não desistir, mas não é isso que acontece. Na verdade, o impacto foi inversamente proporcional. Ele arrasou com o meu ano de vestibular". - Aluna, 17 anos, unidade Tijuca.

"Quando começou a aula, ele me chamou e falou pra sala toda, 50 alunos: 'Pode ficar tranquila, até o final do ano você vai ser domada por mim'".

Reprodução / Twitter / Via Twitter: @belaassumpcao

"Tinha um professor de Inglês que vinha sempre conversar comigo e era muito meu amigo, entre aspas. Ele ficava falando para eu sentar perto dele, para gente ficar conversando e diversas vezes me chamou para ir na casa que ele estava construindo em Vargem Grande. Eu tinha 14 anos!

Também teve um professor de Física que, na primeira aula, levantou, apontou para mim e falou: 'Ei, você, cala a sua boca'. Eu não estava atrapalhando a aula. Desde então, eu não fazia questão de ficar nas aulas dele. Uma vez eu e uma amiga saímos da aula dele e ele veio correndo atrás da gente. Não tinha inspetor no corredor, e ele simplesmente abriu a porta do banheiro feminino, entrou atrás da gente e falou que a gente tinha que sair dali agora e voltar para a sala.

Depois disso, um dia ele abordou a mim e uma outra garota e disse que precisava conversar depois com a gente. A menina respondeu: 'Mas o que que você quer falar, fala aí!' E ele: 'Não, não, isso aqui não é assunto para ser falado aqui'. Aí ela: 'Cara, prova é assunto pra se conversar no colégio, sim. Se você quiser falar alguma coisa, você vai falar comigo agora. Não vou marcar lugar, não vou falar nada com você'. Aí ele começou a rir e saiu andando. Eu fiquei um pouco assustada com essa conversa, mas a menina que estava junto me acalmou e recomendou que se ele quisesse falar alguma coisa comigo teria que ser na sala da coordenação com alguém junto.

Um dia precisei fazer uma prova de recuperação e falaram para mim que ele queria falar comigo. Procurei-o imaginando que ele queria falar comigo sobre prova. Aí ele largou todos os alunos que estavam fazendo a prova sozinhos, fechou a porta e me encurralou no parapeito que dava para o pátio. Ele me prendeu e falou: 'Pelo visto eu ter zerado suas provas não adiantou de nada'. E eu falei: 'É, não adiantou, não, porque eu não preciso de você. Eu me esforço, eu estudo, eu não preciso de ajuda e se você tentar me prejudicar não vai adiantar de nada porque eu sei minha capacidade e consigo passar sem você'. Não tinha nenhum inspetor e ele falou: 'Ah, quero ver se isso vai acontecer ano que vem'. Nisso apareceu um aluno e só aí ele me soltou e eu saí correndo. E, no ano seguinte, ele não deu mais aula nesta unidade.

O terceiro caso foi com o professor de Matemática. Primeiro ele implicava comigo e com as minhas amigas, depois começou a ser só comigo. Um dia, eu e minhas amigas estávamos na sala perto da porta conversando de garotos, sexo, essas paradas, antes de começar a aula. Ele pelo visto prestou atenção e entrou pra dar aula. Aí, quando começou a aula, ele me chamou e falou pra sala toda, 50 alunos: 'Pode ficar tranquila, até o final do ano você vai ser domada por mim'.

Eu cheguei na coordenação para reclamar desse último caso e em vez de me ajudarem, tiraram a minha bolsa. Sobre o professor de Física eu fiquei com pouco de medo de falar alguma coisa na época. Todos esses professores continuam dando aula lá. Tem muito mais coisa, mas eu só vou falar sobre o que aconteceu comigo. Eu já tô até vendo os três me processando, mas eu não vou ficar quieta mais". - Ex-aluna, 18 anos, unidade Freguesia.

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"Ele parou a aula e começou a me assediar moralmente na frente de todo mundo. Ele chegou a dizer: 'Você não é digna de chupar minha piroca'"

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"Essa história aconteceu no ano passado, eu tinha 17 anos e eu estava no terceiro ano. Nesse dia, juntaram as duas turmas em uma classe só. A sala estava cheia e todo mundo colado um no outro. Eu estava conversando com amigos quando este professor parou a aula e começou a me assediar moralmente na frente de todo mundo. Ele chegou a dizer: 'Você não é digna de chupar minha piroca' e outras coisas que prefiro não falar porque não me lembro das palavras exatas.

Este professor sempre falava besteiras na sala de aula. Em uma aula sobre plantações, ele ficou falando sobre bananas de um jeito e tom que desse a entender que estivesse falando de um pênis. E, às vezes falava 'pau' mesmo. A história acabou chegando na coordenação, eles disseram que me apoiariam, porém sempre tentavam relativizar a situação dizendo que: 'Ele estava de cabeça quente', 'Foi uma fatalidade' – e nunca de fato me encorajaram. Por fim, ele foi afastado da unidade e abafaram o caso". - Ex-aluna, 18 anos, unidade Itaipu.

"A coordenadora pegou minha avaliação, me chamou de canto e não me levou a sério, falando que era uma coisa muito séria para eu inventar assim".

Reprodução / Twitter / Via Twitter: @anajjsantos

"A gente tinha um professor de Matemática que dava em cima de várias alunas. Uma das minhas amigas era um alvo recorrente dessas "brincadeiras". Ele fazia comentários como: 'chora em toda aula minha, você fica linda chorando'.

'Veio com esse decote pra quê, quer impressionar quem?'. Teve uma vez que uma menina falou que estava com dor no peito e ele respondeu: 'Quer que eu chupe?'.

Eu tentei denunciar a situação na pesquisa de opinião do aluno, aproveitando que a POA era um espaço anônimo. Mas a coordenadora pegou minha avaliação, me chamou de canto e e não me levou a sério, falando que era uma coisa muito séria para eu inventar assim. Ele continuou dando aula no Pensi normalmente mesmo depois que a gente se formou e só saiu há uns dois meses porque recebeu uma proposta melhor de outro colégio" - Ex-aluna, 18 anos, unidade Madureira

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"Tinha um professor que ficava constantemente olhando para uma aluna com cara de desejo e mordendo os lábios. Quando reclamamos, disseram que não tinha o que fazer porque o professor já tinha 'certo tempo de casa'".

Reprodução / Twitter / Via Twitter: @anajjsantos

"A gente tinha um professor de Biologia que ficava olhando para uma das alunas com cara de desejo e mordendo os lábios. Aí quem viu a cena se juntou para ir à coordenação reclamar, acompanhando a vítima. Chegando lá, contamos os relatos e disseram que nada poderia ser feito porque o professor já tinha 'certo tempo de casa', mas que eles iam conversar com o mesmo.

Na semana seguinte, ele entrou super raivoso em sala, não permitiu a saída de ninguém ao banheiro e quem saísse não deveria voltar à sala. Reclamamos e ele disse: 'quem não gostou pode ir reclamar com o padrinho de vocês' – referindo-se a um adulto que supervisiona a unidade.

Então, rolou novamente isso de ele olhar pra aluna com cara de desejo e nós fomos ao diretor da unidade. O diretor disse que reclamar de assédio é muito relativo, pois olhar todo mundo olha. E disse que ele mesmo, naquele momento, estava olhando pra gente. E ainda terminou perguntando: 'Isso é assédio?'.

Hoje esse professor não dá mais aula para gente, mas o que a gente sabe é que ele não foi afastado por denúncias de assédio e, sim, por problemas de saúde" - Aluna, 18 anos, unidade Vila da Penha I

"Há umas duas semanas, eu tava dormindo na aula dele; ele me acordou e disse que queria fazer uma "massagem tântrica em mim".

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"No ano passado, um professor de Química deu um tapa na minha bunda e na bunda de uma amiga minha. Mas não terminou aí.

Neste ano, este mesmo professor chegou por trás da minha amiga e sarrou nela. Ficou abraçado com ela com a bunda dela encostada no pau dele. Aí ela foi chegar pra frente para desencostar, né? E ele falou: 'Não desencosta, não' e puxou ela de volta e ficou lá por um tempo'. Ela ficou lá com uma cara de desesperada. E eu não sabia o que fazer também.

E aí, ainda este ano, há umas duas semanas, eu tava dormindo na aula dele e ele me acordou e disse que queria fazer uma "massagem tântrica em mim". - Aluna, 15 anos, Unidade Martins.

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Diante da atitude da coordenação de ignorar sistematicamente as denúncias de assédio, algumas meninas nem chegaram a comunicar seus casos à coordenação.

"Depois de pegar na minha mão de um jeito estranho e de olhar muito fundo nos meus olhos, no outro dia ele disse: 'Não vai embora agora, não, vai às três' – era a hora que ele saia e ia pra casa".

Reprodução / Twitter / Via Twitter: @belaassumpcao

"Bom, eu tinha uma amizade muito forte com todos os funcionários, sempre brincava com todos eles e gostava muito do colégio exatamente por isso. Eu costumava conversar bastante com o porteiro da escola, gostava muito dele, inclusive.

Mas depois de um tempo ele começou a me tratar diferente. Me olhava estranho, fazia brincadeiras e depois falava: 'Tô brincando, gosto muito de você'. Uma vez ele pegou na minha mão de um jeito muito estranho e olhou nos meus olhos.

Nesse momento eu gelei e não soube o que fazer, tirei minha mão e sai de perto dele e uma outra vez ele me disse: 'Não vai embora agora, não, vai às 15h', sendo que essa é a hora que ele sai do trabalho e vai pra casa. Nisso, eu evitei ele por várias semanas mas nunca contei isso a ninguém, só uma amiga minha sabia.

Sempre achei que fosse algo da minha cabeça por não ter "nada demais", mas sempre pensei na possibilidade de não ser também". - Aluna, 16 anos, unidade Freguesia.

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O diretor ficava me mandando mensagens como: 'Vai pertinho da minha casa e nem me chama 😔'".

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"O diretor da escola, que vivia me abraçando pelos corredores, ficava me mandando mensagens no Facebook. Não cheguei a falar nada na época porque ele tinha o cargo mais alto, achei que não ia adiantar de nada. Eu também fiquei com medo de ele fazer alguma coisa comigo. Pelo que eu sei, ele assediou outras meninas, não fui a única". - Aluna, 16 anos, unidade Madureira.

Entramos em contato com o Colégio Pensi para que eles comentassem as denúncias de assédio. A resposta oficial está reproduzida a seguir na íntegra.

A rede Pensi repudia qualquer tipo de assédio e discriminação. Essa é uma questão relevante, tratada com colaboradores, alunos e responsáveis, prezando pela integridade física, psicológica e moral. A instituição informa que está apurando internamente as denúncias e que ações firmes estão sendo tomadas:

• O Canal Confidencial Pensi (helloethics.com/pensi), para relatos de assédio e discriminação, a cargo de uma empresa externa especializada em receber denúncias anônimas, está em funcionamento;

• O Comitê de Ética formado por agentes externos e composto majoritariamente por mulheres, responsável pela imediata apuração dos fatos e implementação de ações rigorosas para banir casos de assédio e discriminação, está em ação. Toda denúncia está sendo avaliada individualmente pelo comitê e cada caso está sendo tratado com a responsabilidade e seriedade que a situação exige. As consequências podem ir de advertência até demissão.

• Intensificação da divulgação do Código de Ética em vigor, que está sendo debatido em profundidade com colaboradores das unidades, assegurando que nenhuma conduta irregular será tolerada. Também foram tomadas medidas para intensificar os treinamentos relacionados às questões éticas, com foco especial na temática assédio e discriminação, ressaltando a intolerância a situações dessa natureza.

• Manutenção dos atendimentos já existentes nas unidades dedicados ao acolhimento de alunos e responsáveis, com o apoio de psicólogos.

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Questionamos também se a escola tinha conhecimento das denúncias antes de a hashtag estourar. A resposta foi a seguinte:

Todos os relatos que chegam ao conhecimento da rede são apurados e as ações cabíveis são tomadas. Os casos são tratados com o cuidado e a cautela que a situação exige, em respeito a todas as partes envolvidas.

A não divulgação das medidas adotadas após a conclusão da apuração - em respeito a todas as partes envolvidas - pode ter gerado a percepção de que atitudes não foram tomadas, o que não corresponde à realidade.

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