Eu fui à cidade de Quebec no meio do inverno, e você também deveria ir

Mãos frias, pés dormentes, imperdível.

Se e quando você for à cidade de Quebec no Canadá em meados de fevereiro, vai encontrar um boneco de neve que adora dar chutes altos. O mascote oficial da cidade, um símbolo do inverno que parece um "Boneco da Michelin" grandalhão, conhecido como Bonhomme (literalmente, "boneco de neve"), é uma espécie de ginasta, e ele adora mostrar sua flexibilidade no carnaval de inverno anual da cidade. Em mais de uma ocasião durante nossa recente viagem à cidade de Quebec, eu e minha amiga nos deparamos com o Bonhomme vindo todo desengonçado até nós e, depois, apoiando uma de suas pernas roliças revestidas de lã no chão e erguendo a outra perna até sua mão estendida. Era ao mesmo tempo aterrorizante e sublime.

No entanto, parecia que presenciar essas travessuras era uma parte necessária da nossa viagem. Escolhemos a capital impossivelmente congelante da província canadense de língua francesa para umas férias de inverno, e a constante presença nevada do Bonhomme em todos os lugares aonde fomos sempre nos lembrava da insanidade do que havíamos feito.

Você, um ser humano razoável, talvez se pergunte: Que diabos a gente estava pensando? O que poderia levar duas garotas da Costa Leste dos EUA, em pleno inverno, a comprar passagens para um clima ainda mais frio do que o que já estávamos enfrentando?

Dica: não foi por puro masoquismo.


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Bea Travis / BuzzFeed

Estruturas enormes feitas inteiramente de gelo e neve.

A cidade de Quebec chamou nossa atenção por alguns motivos óbvios. primeiro, tem um carnaval, que definitivamente é uma coisa divertida para fazer. Além disso, achamos que estaria bem mais vazia nessa época do ano do que os destinos tropicais ao redor do mundo. O preço favorável do dólar americano também não fez nenhum mal. Mas o que nos levou a comprar passagens para o lugar com mais neve do Canadá, na época com mais neve do ano, foi o seguinte: precisávamos lembrar de como era a magia.

Por mais exagerado que isso pareça, todo mundo concorda que, quando você perde todo o encanto por causa das realidades da vida, você precisa encontrar um jeito de se reencantar. Nunca gostei da ideia de tirar férias para "reiniciar a vida", simplesmente zerando o cronômetro do Dia do Juízo Final. As férias são, na minha humilde opinião, uma das poucas coisas que nos dão força suficiente para enfrentar as adversidades do dia a dia. E, se você se identifica com isso, mesmo que um pouquinho, então, prezado leitor: você precisa ir à cidade de Quebec.

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Sam Corbin / BuzzFeed

Este Bonhomme não dava chutes altos, mas só porque ele era feito de cimento.

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O Carnaval de Québec, para quem não conhece, é um dos maiores festivais de inverno do mundo (costumava ser *o* maior, mas foi recentemente ultrapassado por outro na China). Todos os anos, durante 10 dias de fevereiro, a cidade de Quebec vira um globo de neve vivo: restaurantes erguem arcos de gelo e escorregadores de neve; cantores de jazz e folk cantam em estandes patrocinados por lojas de bebidas; um vilarejo de inverno surge na cidade velha, com direito a labirinto de gelo, cadeiras de praia feitas de neve e todo tipo de guloseimas caramelizadas que você possa imaginar.

"O que nos levou a comprar passagens para o lugar com mais neve do Canadá, na época com mais neve do ano, foi o seguinte: precisávamos lembrar de como era a magia."

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É tudo bastante canadense.

Naturalmente, a cidade de Quebec não precisa de um festival para ser considerada uma maravilha de inverno por si só. A cidade fica tomada de neve durante a maior parte do inverno. E, à medida que a neve continua caindo, a cidade parece se recusar a salgá-la. Como resultado, as calçadas parecem mais pistas de patinação no gelo, e muitos dos espaços abertos mais amplos, como os parques urbanos, ficam até 1,80 metro mais elevados do chão. (Ficamos perplexas com uma série de bancos que vimos no parque, apontando na neve abaixo de nós, e só depois nos demos conta de que eles ficavam no nível da grama no verão.)

Se você está ainda mais perplexo com meus argumentos agora do que no início deste artigo, continue comigo.


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Bea Travis / BuzzFeed

Lojas locais de bagels se tornaram nossos oásis de inverno.

Coberta de branco, a cidade de Quebec cria um distanciamento quase budista das costumeiras armadilhas das férias. Não precisávamos nos preocupar com o que vestir, já que nossa única preocupação era quantas camadas caberiam debaixo de nossos casacos de inverno. Todos os alimentos pareciam um sustento abençoado em vez de um excesso pecaminoso. (Nós comemos bastante fritura.) Também não dava para apressar nosso itinerário: os caminhos congelados nos obrigavam a reduzir a velocidade, literalmente, e a aproveitar os cenários à nossa volta.

O melhor de tudo? Na maioria das cidades muito, muito frias, beber para se aquecer faz parte da cultura.

Incapazes de viajar mais de meia hora em temperaturas abaixo de zero, a gente se refugiava em um lugar após outro. E o eclético cenário de bares de Quebec nos proporcionou todo tipo de conforto: batatas fritas mergulhadas em vinagre de malte e cafés misturados com bebidas alcoólicas em um pub irlandês; cerveja artesanal e amendoim torrado em um palácio de karaokê de dois andares; taças de boca larga de vinho Bordeaux e charcutaria vegana em um ponto de encontro hipster dentro de uma antiga igreja; cervejas locais e pitas em um bar sombrio, onde frequentadores nos animavam com músicas tradicionais de Carnaval e tocavam longas cornetas de plástico para qualquer um que entrasse.

Tudo isso, além de outros confortos — bom café e, não menos importantes, bagels —, estava começando a ter seu efeito sobre nós. Mesmo quando perdíamos o tato em nossas extremidades, estávamos formigando com outro tipo de renovação.

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Sam Corbin / BuzzFeed

Contemplando o silêncio em uma exposição no Musée National Des Beaux-Arts.

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"Coberta de branco, a cidade de Quebec cria um distanciamento quase budista das costumeiras armadilhas das férias."

Se todos os itens acima parecerem a alucinação errática de alguém que sofreu uma queimadura de frio, prometo que os eventos culturais de Quebec confirmaram uma apreciação mútua pelo inverno e uma espécie de mitologia comunal em torno de seu poder inominável.

Milhares de pessoas se reuniram ao longo da Grande Allée a 22 graus negativos para acompanhar o desfile de carnaval, que começou com um par de atores liderando as multidões numa sessão de aeróbica em massa para se manterem aquecidas até o início do desfile. Descobrimos a Maison De La Littérature, uma igreja que virou biblioteca com paredes abobadadas inteiramente pintadas de branco, evocando o inverno em ambientes fechados, enquanto a neve caía do lado de fora de suas janelas altas. Visitamos uma exposição no Musée National Des Beaux-Arts dedicada inteiramente ao inverno, expondo as virtudes da estação com citações de contornos suaves escritas em tons pouco visíveis na parede e entrevistas em vídeo de crianças de toda a cidade.

Sobre o inverno, um menino no vídeo disse em francês: "Imagine a coisa mais fria em que você pode pensar... e multiplique por 10."

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Bea Travis / BuzzFeed

A cada ano, o rio São Lourenço mostra mais e mais sinais da mudança climática.

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Não vai ser sempre assim.

No final de nossa viagem — depois que aprendemos a relaxar em um desconforto ligeiramente congelante —, passamos algumas horas no Au 1884, um escorregador de gelo centenário ao ar livre, com vista para o rio São Lourenço. De dezembro a março, o escorregador reúne crianças, adultos e até mesmo alguns cães, que descem uma das três pistas de madeira sem atrito, atingindo até 49 quilômetros por hora e balançando as bochechas contra o vento que vem do São Lourenço.

Agarrando-nos à escadaria de madeira íngreme e coberta de neve que levava ao topo do escorregador, conseguimos olhar para o rio abaixo. Apesar da estação, a água do rio não estava nem um pouco congelada; em vez disso, dunas de gelo desiguais vagavam sem rumo pela superfície, sem dúvida derretendo enquanto faziam sua migração ociosa.

Agora, vamos falar sobre o cronômetro do Dia do Juízo Final. A mudança climática é um mal silencioso, mas eu nunca estive mais ciente disso do que na cidade de Quebec, onde os cidadãos admitem em tom triste um futuro sem inverno como uma realidade inevitável. Depois de descer o escorregador algumas vezes — o que de fato foi tão emocionante quanto os gritos das crianças faziam parecer —, conhecemos Marc Duchesne, um dos dois parceiros de negócios contratados pela Parks Canada para administrá-lo e mantê-lo. Ele defendeu com unhas e dentes o trabalho necessário para manter o Au 1884 operacional e citou a deterioração gradual do escorregador como prova da mudança climática de Quebec: o gelo ao longo da base tem descongelado mais rápido a cada ano com a força do sol. Quando a camada de neve fica fina demais, não é seguro descer, e ele precisa ser fechado durante toda a estação.

Marc sorriu timidamente ao nos dizer isso, mas seu semblante descaiu um pouco. Ou, poderíamos dizer, "derreteu".


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Bea Travis / BuzzFeed

Todas as imagens são cortesia de Maria Bea Travis, salvo outra indicação.

Para nós, uma viagem em pleno inverno à cidade de Quebec descongelou nossos corações para melhor. O calor pode não estar na previsão do tempo de Quebec (pelo menos por enquanto), mas com certeza está no espírito do lugar. A hospitalidade não é morna, provinciana, excessivamente sentimental ou sulista; é alerta, perspicaz, direta e ansiosa para lhe dar algo para beber quando você não consegue sentir os dedos dos pés. E isso dava nova vida ao que havia restado de nossos pés.

A partir do momento em que estávamos taxiando na pista do aeroporto de Quebec, era como se eu e minha amiga estivéssemos suando ao contrário. Ficamos tristes ao nos despedir da cidade que nos tornou mais fortes — embora, no avião, não pudéssemos deixar de nos deleitar com o jeito como nossas calças de camada única roçavam suavemente em nossas pernas, com meias finas cobrindo os pés sem botas. De volta a Nova York, pisoteamos com alegria as poças de lama marrom entre nós e nosso táxi. Isso não era nada.

Não sei o que você procura nas férias. Talvez você zombe da ideia de enfrentar a tortura congelante em nome da epifania espiritual. Sou judia, canadense e moro em Nova York, então, procurar sofrimento sob a forma de temperaturas congelantes, para que eu possa beber para me sentir bem, está, de todas as maneiras, escrito no meu DNA. Mas, se você se identifica nem que seja com uma dessas coisas, ou simplesmente gosta de se maravilhar em lugares distantes, então não posso dizer o bastante: Vá, vá, vá para a cidade de Quebec no inverno. Vá pelo Carnaval. Vá pelo espírito. Vá pela magia no estilo de Nárnia com castelos de neve e delícias açucaradas.

E, se não for por outro motivo, vá enquanto ainda pode — antes que o gelo derreta pela última vez em um tom de vermelho e tudo o que restar do segundo maior país das maravilhas de inverno seja um homem vestido de mascote dando chutes altos em um auditório vazio.

Este post foi traduzido do inglês.

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