10 coisas que os povos indígenas gostariam que você soubesse

"Quando lutamos pela demarcação das nossas terras, estamos lutando para que vocês respirem, bebam água limpa e se alimentem."

Perguntamos a indígenas de diferentes povos o que gostariam de compartilhar sobre suas vidas aqui no Brasil. Selecionamos neste post as respostas de destaque. Alguns dos textos foram editados ou adaptados por questão de clareza e/ou tamanho.

1. "A primeira fake news da história é dizer que o Brasil foi descoberto por Pedro Álvares Cabral."

A primeira fake news da história foi ensinar nas escolas que o Brasil foi descoberto por Pedro Álvares Cabral. Depois, que a primeira ditadura foi em 1964. Nós sofremos uma ditadura militar em 1500. Posso estar viva, mas sendo morta o tempo inteiro: existe o genocídio, matança na disputa por terras; o etnocídio, a matança da nossa identidade; e o epistemicídio, matança dos nossos conhecimentos. O que posso dizer é que tentem retomar suas histórias e se reconectar com o quem vocês são, de onde vieram. É a identidade que move a estrutura e o reencantamento da vida.

Célia Xakriabá (30), povo Xakriabá, professora, mestra em sustentabilidade junto a povos e terras tradicionais pela UnB.

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2. "Para quebrar a lógica colonialista, é preciso ouvir o que indígenas de múltiplos contextos e regiões do Brasil têm a dizer."

Reprodução / Via medium.com

Os indígenas urbanos são constantemente deslegitimados por não fazerem parte de um imaginário específico - e muitas vezes racista e etnocida. Não existe só um modo de ser indígena, e pensar o contrário é também uma herança colonialista. Para deixar 1500 para trás, é preciso quebrar a lógica colonialista, e esse é um processo lento e complexo que só pode ser combatido ouvindo o que indígenas de múltiplos contextos e regiões do Brasil têm a dizer.

Jamille de Souza, Parintintin, publicitária.

3. "Jovens indígenas passam por desafios semelhantes aos não indígenas."

Reprodução / Via Twitter: @Naine_Terena

Existem jovens indígenas criando moda, biojoias, arte e tirando daí seu sustento. Agora mesmo alguns da minha aldeia estão fazendo curso de artesanato, participando de eventos, promovendo desfiles. Gostaria que os jovens da cidade conhecessem esses outros jovens. É importante entender, divulgar, trocar, saber como vivem. Poderão perceber que são parecidos e passam por desafios semelhantes.

Naine Terena de Jesus, Terena, doutora em Educação pela PUC SP.

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4. "Somos o futuro, já que o mundo capitalista se mostra fadado ao fracasso."

Os povos indígenas não podem ser vistos apenas no passado; somos sobretudo o presente e o futuro, já que este mundo capitalista se mostra cada vez mais fadado ao fracasso.

Edgar Kanaykõ, Xakriabá, mestre em Antropologia e fotógrafo.

5. "Quando vir um indígena com celular ou laptop, não o veja como alguém que perdeu sua cultura."

A cultura indígena não é estática, imutável. Além disso, toda a violência da colonização ao longo dos anos forçou vários povos tradicionais a aprenderem novas tecnologias. Então quando você encontrar um indígena com celular ou laptop nas mãos, entenda que ele está com uma ferramenta de auxílio e não é alguém que "perdeu" sua cultura. A identidade cultural vai além das ferramentas e tecnologias, é algo maior do que qualquer objeto.

Denilson Baniwa, Baniwa, artista visual.

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6. "Nada que fazemos ou temos nos faz deixar de ser quem somos."

As pessoas precisam entender que não somos o "índio folclore" que está no imaginário coletivo. Existimos com nossa pluralidade, diversidade étnica e nada que fazemos ou temos nos faz deixar de ser quem somos. Se não lutam pela nossa primeira causa, que é a causa indígena, como podem lutar pelas demais? Afinal de contas, estamos em terras indígenas.

Katú Mirim, Boe Bororo, é rapper, atriz e ativista.

7. "Povos indígenas não são 'índios', que andam nus e que não podem fazem nada que seja atual."

Os povos indígenas não são “índios” - esses que vemos nos livros de história e que só ouvimos falar, que andam nus e não podem fazer nada que seja atual. Povos indígenas são ancestrais, revolucionários e contemporâneos em todas as áreas possíveis da polis e da ciência.

Benício, Pitaguary, artista plástico, comunicador e estudante de Geografia na UFC.

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8. "Ser indígena é ocupar espaços sem deixar de ser quem você é."

Ser indígena no Brasil é lutar contra o constante processo de colonização que insiste em dizer o que devemos ser. É um processo de resgate, de lutar pela memória dos antepassados e das tradições. É ocupar espaços sem deixar de ser quem você é.

Samuel Luz, Guajajara, estudante e pesquisador.

9. "Quando lutamos pela demarcação das nossas terras, estamos lutando para que vocês respirem, bebam água limpa e se alimentem."

Quando lutamos pelo meio ambiente ou pela demarcação das nossas terras, estamos lutando para manter viva a dignidade de todos: o direito de beber água limpa e de se alimentar. Nós todos respiramos o mesmo ar e pisamos na mesma terra, então por que pensar e agir diferente, uns contra os outros?

Shirley Krenak, Krenak, publicitária e ativista em defesa do meio ambiente.

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10. "O divino está dentro de nós"

Meu nome une o nome indígena com os sobrenomes dos não-indígenas, e diz muito sobre o que eu sou. Eu não sei a que povo específico eu pertenço. Sei que é algum povo da região do baixo Tapajós/Amazonas e que lá existiam muitos povos. Arapium, Cumaru, Gurupa, Jaguaim , Munduruku, Maytapu, Borary, Tupinambá, Tapacorá, Carary, Jacaré - Tapiá, Cuarirana, Sapopé, Uará - Piranga, Apanauria, Motuary… Para estes povos migração era algo constante, pois buscavam melhores terras pro roçado e também fugiam dos colonizadores. Na região onde meus avós nasceram, por exemplo, existiam quilombos onde negros e indígenas se uniram fugindo da escravidão. Então é super difícil buscar uma história que passou por rios e locais que não encontramos nem no Google Maps.

Busco minha história para me autoconhecer, levantar a minha auto estima e dos meus parentes. Para mostrar à sociedade que conhecimento não vem só da academia, que está vivo na memória daqueles que sempre se relacionaram com a floresta. Mostrar que religião também é acreditar em seres encantados, e que essa cosmovisão não é inferior a nenhuma forma de pensamento ocidental. Sigo viva e apoiada pelos meus ancestrais, na fé que um dia seremos valorizados como qualquer outro povo nesse mundo: Tupã uiku yandê pupé (tupã, o divino ou místico, está em todos nós).

Moara Brasil Xavier da Silva, Baixo Tapajós, artista visual e comunicadora social pela UFPA, e idealizadora do projeto Museu da Silva.

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